quinta-feira, 10 de maio de 2012

LA BLONDE GRIS


O jovem médico foi ascendendo na carreira acadêmica  até que foi aprovado  no concurso para assistente numa cadeira da faculdade de Mediciina.

No primeiro dia de aula, uma turma de rapazes e moças, todos muito jovens, relutavam em fazer silêncio para que ele se apresentasse. A  duras penas  impôs silêncio, apresentou-se e pediu que cada aluno dissesse seu nome e de onde vinha. Não deixou de notar uma mulher um pouco mais madura, perto das frangotas que havia ali. Deveria ter seus 26 anos. Era loira, alta. Não usava jeans ao contrário das demais, nem tinha tatuagem. Usava saia e blusa e sua  pele era alva. Loira natural, tinha um nariz aquilino e uma boca que  poderia ser um pouco mais  carnuda.

Não se sofreu e lhe perguntou quantos  vestibulares tentara. Cinco, disse ela.

Ela não se misturava nos grupelhos e tribos que se formam. Ficava ereta e misteriosa na sua saia preta, meias escuras, salto alto e camisa branca, deixando a entrever seios muito firmes.

E assim foi se seguindo o semestre.

Quando Artur não estava na faculdade, atendia um pouco na clínica do pai.

Numa 2ª. Feira de tarde chegou e viu na sala de espera a Maria da Graça. Só então observou que ela tinha belíssimos joelhos mas suas meias  tinham furos e seus sapatos de salto estavam puídos. Dirigiu-se a ela, que  permaneceu sentada mas colocou o rosto entre as duas mãos e prorrompeu num pranto discreto e manso.

Sentou-se ao lado dela, tomou  uma de suas mãos e sentiu que eram um pouco ásperas.

Ela contou que era do interior, fora casada dois  meses, o  marido se mostrara violento e ela estava sendo sustentada pelos pais, mas agora o dinheiro mermara e não tinha mais como pagar a faculdade.

Já no apartamento dele à tardinha, ofereceu-lhe nozes, castanhas, abriu uma latinha de atum e trouxe um pacote de bolachas Piraquê.

Acordaram abraçados  às 6 da manhã, ela levantou antes, tomou um banho após ele lhe mostrar a torneira quente.  Ela não se depilava no “ brazilian way” e sim tinha um triângulo bem peludinho.

Começaram a namorar discretamente. Ele começou realmente a gostar muito dela.

Até que um dia ela, numa festa, excedeu-se na champagne e começou a flertar com um colega estudante. Dançava frenética feita uma Jezebel.

Arthur largou tudo e foi embora para seu apartamento.  Já deitado, depois de uma hora, pensou que fizera uma cena de ciúmes infantil. Esperou-a  já desnudo.

As horas foram passando e ela não veio.

Não apareceu mais na faculdade.

Dez anos mais tarde encontrou-a em Paris, de braços com um senhor de cabelos brancos.

Vestia-se no “ dernier cri de La mode”, os cabelos tinham tomado a tonalidade “ blonde gris” tão rara no  mundo e só encontradiça  na Alsácia.

Ela só o cumprimentou com um solene meneio de cabeça.

Perturbou-se tanto que não reparou se suas meias não estavam mais rasgadas.