quinta-feira, 27 de junho de 2019

DA SABEDORIA ANTIGA

Sempre gostei de História e principalmente de normas e provérbios antigos.Hamurabi, que viveu cerca de 1.700 anos antes de Cristo, compilou uma série de leis. Maior parte delas hoje nos pareceriam cruéis. Uma das mais famosas é a “ olho por olho, dente por dente”. Mas entre as dezenas delas , uma me impressionou. Dizia , em síntese, que se um “ awilum” ( cidadão) tivesse bens furtados e não soubesse o autor, deveria ir ao Templo descrever tais objetos, jurando serem verdadeiras suas alegações, que seria ressarcido pelo tesouro real. O que é isso senão a responsabilidade objetiva do Estado, que temos hoje?
A Bíblia, como todos sabemos, é uma compilação de preceitos, narrativas, ordenações, provérbios. A mim interessa muito o Antigo Testamento.
Hoje, já com os cabelos tordilhos, posso assegurar que a maioria dos provérbios que se acham na Bíblia, bem como nos repositórios de quase todas as civilizações, são pérolas do saber.
Vamos para o livro dos provérbios da Bíblia. No capítulo 22 está escrito: “ Bom renome vale mais do que grandes riquezas, a boa reputação vale mais que a prata e o ouro” . 
Com efeito, quantos exemplos temos de pessoas ímprobas, que acumularam riquezas até mais não poder, usando de meios ilícitos e que, ao chegarem no último quarto da vida ,amargam não terem  nem o afago e nem a assistência de seus descendentes. Tendo já falecido e ante a menção de seu nome, nenhuma frase de louvor e respeito, mas o desdém.
Vamos ao versículo 23.22. “ Dá ouvidos a teu pai, àquele que te gerou e não desprezes tua mãe quando envelhecer”.
Aqui se cria, hoje em, dia um problema. Como assim se em muitas famílias pais e filhos não conversam?
Mas vamos para temas que muito estão sendo debatidos. Observemos  o que diz um dos livros da Bíblia: “ Deuteronômio 16:19, “Não perverterás o direito, não farás acepção de pessoas nem aceitarás suborno, pois a corrupção cega até os olhos dos sábios juízes e prejudica a causa dos justos”.
Para se ver como há séculos havia a preocupação com uma justiça imparcial e honesta.
Nos Salmos, 93. 20 , mais um alerta antigo e hoje atual: “ Acaso poderá aliar-se a vós um tribunal iníquo, que pratica vexames sob a aparência da lei?”
Para concluir, cito  novamente o Deuteronômio , quando se refere ao juiz: “não aceitarás presentes, porque os presentes cegam  os olhos do sábio e destroem a causa dos justos” ( 16.17).

Não são de hoje, como se vê , as advertências sobre o bem viver, sobre a harmonia, a retidão e a seriedade que devem imperar. Inclusive em todo o universo jurídico.

terça-feira, 25 de junho de 2019

CARTA DE TITO GUARNIERE PARA EMANUEL


Caro Emanuel :
Que pena, Emanuel, que logo você, que me falou um dia de uma manhã azul, e me tocou tanto, agora  as manhãs são  as que mais doem.
Mas, desculpe, não fico penalizado. Tenho-o da conta de um homem elevado e corajoso. Claro, não a ponto de amenizar a dor física. A ninguém ainda foi dado tal privilégio. E é fácil, à distância, só com as dores da idade (que no meu caso não são tão dramáticas) fazer comentários a respeito.
Em todo o caso, Emanuel, admiro tua paciência, teu estoicismo - tua lucidez e tua -de novo - coragem.
Belo texto, palavras certeiras, estilo íntegro, que nem a doença logrou alcançar.  Tua escrita é, por assim dizer, o sinal mais forte de que ainda estás de pé. Sei que existem os sentimentos, as doces lembranças, o convívio amoroso com os teus. Sei que devem existir momentos de desânimo. Não sei quando partirás - espero que ainda tenha um bom trecho da estrada. Mas precisas saber que, de algum modo, deixarás um legado, de gestos, palavras, atitudes - sonhos sonhados e desfeitos, esparanças vívidas e realidades decepcionantes. O que importa , já disseram tantos, é a caminhada, não o destino final.
Nós sempre teremos a nosso favor o sorriso largo e o riso solto, a filosofia fácil e a que não se compreende bem, a  bisbilhotagem infantil, as nossas previsões catastróficas, o otimismo contido, o nosso amor à vida, as paixões secretas e as que não dava para disfarçar,  a nossa discreta proteção dos amigos(ignorando os seus-deles-erros e defeitos), perdoando aqui e acolá  mas não esquecendo, derramando uma lágrima sutil de emoção da cena do filme, do acorde da música, da rima poética, do texto que  gostaríamos de ter escrito(mas que coube a outro mais telantoso), dos nossos tropeços, dos nossos êxistos modestos, dos nossos medos - bem, Emanuel, de tanta coisa, como aquelas que você descreve a fala no teu texto. 
"Nunca esqueça" - , leio o título e me vêm a cabeça o que disse alguém ( não tenho facilidade para as citações , como você ): " Quando eu era mais novo, me lembrava muito bem do que tinha acontecido e do que não tinha acontecido. Agora, a caminho da velhice, sinto que só me lembro do que não aconteceu". (a citação é mais ou menos assim, não é literal).  
D'ont forget, dear friend, que neste lado de baixo do mapa deste país tão esgarçado nos seus dramas e nas suas contradições, há gente como eu que reza e torce pela vida, que deseja ardentemente e reza pela teu bem estar e pela tua saúde.

Abraço do N.Wedekin

segunda-feira, 24 de junho de 2019

NEVER FORGET


NEVER FORGET” 
(“NUNCA ESQUEÇA”)
EMANUEL MEDEIROS VIEIRA

Neste dia em que o inverno começa, não queria pedir indulgência pela emoção.
Escuto “Never Forget”, com Michelle Pfeiffer, e lembro-me do morango com nata que mamãe fez para mim quando passei no Exame de Admissão (não existe mais) no “Colégio Catarinense”, na Ilha, e iria para o Ginasial (também não existe mais).
Da letra: “Você está em casa”.
Nasci tarde demais.
“Diga que vai me entender”.
Revi mais uma vez “Meia Noite em Paris” (“Midnight in Paris”), de Woody Allen.
O tempo melhor de nossas vidas será sempre o que não vivemos: o outro – além.
Recordei-me de um diálogo de um filme em que um personagem, ironicamente, pergunta a outro se ele é um “suicida”.
O interlocutor responde de bate-pronto: “Só de manhã”.
E era o horário do dia que eu mais amava – havia um ritual, abria as cortinas do quarto e dizia: “Bom dia, dia”.
Bom dia, dia.
Querem saber (relevem o vitimismo) o que é um câncer doloroso e incurável:
A Velha Companheira, a Indesejada das Gentes na soleira da porta para me dar o bote, e eu espero, vivo esperando, vivo achando que sempre falta alguma coisa.
Afinal, o que é o câncer incurável? É isso. Ser suicida de manhã (a gente não se mata não), para mim a hora que mais dói (literalmente, não é dor metafórica ).
Meu (hipotético) Pai: Poupe-me das dores físicas, que das morais eu mesmo cuido.
“Amor e saudade estão estáveis”.
Recordei-me de uma discussão sobre a Misericórdia Divina e a Raiz do sofrimento e do Mal entre dois padres jesuítas cultos no início da década de 60, no “Colégio Anchieta” – onde fiz o antigo Curso Clássico, também estudei com Bolsa de Estudos (como no “Catarinense” em Florianópolis), em Porto Alegre.
O Sofrimento é um Mistério? É. Mas a constatação não me satisfaz.
Por que Deus teria feito os homens tão imperfeitos?
E a raiz do Mal? – insisto.
Vi aos 20 anos uma criancinha numa cadeira de rodas e aquilo nunca me saiu da cabeça.
Penso em Franz Kafka e Albert Camus – santos de minha imensa devoção – e constato: O Absurdo é a evidência que desperta.
Quando eu tocava no assunto, todos retrucavam: “Esqueces do Livre Arbítrio”.
Resta-me escutar de novo “Never Forget.
Uma voz mais forte me adverte: “Não seja chorão”.
Um homem de verdade enfrenta a morte de frente, olha nos seus olhos, bem lá dentro e deverá dizer: avante.
Michelle canta pungente e suavemente.
Por favor, escutem (a letra e a música).
O morango com nata, com um suco de maracujá, uma regata, o rosto de minha mãe, ela no fogão de lenha, posta de tainha frita, pirão d’água, e essa emoção que inunda esta manhã – ria, sem lágrimas.
Rio, com lágrimas...
Sentimental demais.
Estou segurando este meu Inimigo Íntimo há quatro anos, cinco meses e vinte e um dias.
Alfredo David, meu sobrinho e amigo, tão iluminado e amado, faria hoje 60 e foi-se com 28 anos.
Os mais brilhantes de uma geração carregam nas mãos uma vela que queima mais rápido?
Alguém me perguntou se minha geração – a de 1945, do final da guerra, fracassou.
Se quiser ser sincero, diria que internamente meus companheiros, meus melhores amigos, fizeram o que amaram: foram professores, editores, escritores, cineastas, cientistas políticos, engenheiros, jornalistas, advogados, médicos, arqueólogos, enfermeiros, servidores públicos, dramaturgos etc.
Deu para o gasto – não sei se para o gosto...
No outro sentido, sim, fracassamos.
A injustiça que combatemos nos nossos eternos 20 anos, cresceu, como a brutalidade, a morte na tortura, a vitória (provisória?) novamente da ignorância, da xenofobia, do preconceito, do ressentimento, do horror à inteligência, do neopentecostalismo mais reacionário, das redes antissociais fundamentalistas, do individualismo feroz, e do que mais deplorei e deploro, até o último momento da minha vida: a desigualdade torpe e obscena.
(Quero dizer eu tenho alguns amigos evangélicos autênticos e íntegros – não sou dono da verdade.)
VIVEMOS NO BRASIL E NO MUNDO UM PROCESSO DE REGRESSÃO CIVILIZATÓRIA.
Tomo os remédios, cuidam de mim, ainda como tainha frita, nata raramente encontro, e minha memória parece uma alameda de mortos – amigos tão amados.
E Michelle canta: “Jamais te esqueceremos”.
Ela proclama: “Você vai voltar para casa”.
Casa. Casa.
“Lembrei de todos os dias do sol de verão antes do inverno chegar”.
“Jamais vamos te esquecer.”
UM DIA ESTAREMOS TODOS EM CASA.
"Todas as imagens serão calcinadas pelo tempo. No máximo, nas conversas em volta de uma mesa de festa , pode ser que alguém lembre-se de uma parenta morta. Seremos apenas um nome, cujo rosto vai se desvanecer até desaparecer na massa anônima de uma geração distante". (Annie Ernaux).
E alguém acrescenta: "Nada restará de ninguém; Mas até lá, até o fim, até o nada, dará para compartilhar gestos, cidades, sentimentos, raciocínios, lágrimas, o mundo. Será possível sentir o que é comum a todos, a solidão".
Já foi muito repetido (justamente cristalizado): a arte nos salva, nos legitima.
Recordo-me do grande escritor negro norte americano James Baldwin (1924-1987): ”O riso e o amor vêm do mesmo lugar, mas pouca gente vai lá".
(Brasília, junho de 2019)

Livre de vírus. www.avg.com.


quinta-feira, 20 de junho de 2019

ANDANÇAS POR RÁDIOS E TV III


Como estava dizendo o programa inaugural na Pampa foi um balaço. Em ponto às 7 tocava a cortina eu entrava no ar com a hora certa, rápida saudação aos ouvintes, número do telefone para recados e já passava para as manchetes do jornal O Sul que também circulava aos domingos. E eu pronunciava OOOOOO SUUUULL, o que deixava o pessoal bem faceiro. Não contente com isso eu mesmo cantava o jingle do jornal.
Com o passar das semanas o programa foi sendo conhecido e depois de meio ano o Ibope deu que nosso programa dominava a audiência no horário entre as classes A/B.
Eu tinha um time de amigos os quais eu entrevistava no decorrer do programa, entre eles o Heitor Schuck. Ele era uma atração extra por seu sotaque de colono alemão. Eu perguntava como estavam as safras, problemas da agricultura, o que era de muito agrado dos urbanos. De vez em quando soltavamos umas frases em alemão, só para agitar as massas. Para assuntos políticos eu chamava gente de todos os partidos, mas não para falar em política e sim saber um pouco da vida e da trajetória deles e delas. Geralmente eu telefonava dias antes, oportunidade em que  já combinava uma pergunta picante. Em assuntos jurídicos eu sempre pedia que não falassem juridiquês. E, o principal, perguntas curtas e respostas sintéticas. Quando chegava aos cinco minutos eu dizia: “ amigo, que boa entrevista, tchau” e já entrava uma música.
Durante um tempo eu omiti que a Maristela era minha mulher e só a chamava de Maristela Genro, omitindo o Gessinger. Eu a iincumbia, alternadamente com o Rudolf, que tinha uns 8 anos, de  ler os recados dos ouvintes. E ficava me “ galinhando” para ela, o que agitava os ouvintes: “ oi minha querida, tudo bem contigo?” fala os recadinhos, minha flor”. E os ouvintes comentando o “ romance”.Diziam : “ esse cara tá dando em cima de ti!”.
Grande lance do meu programa foi  ter anunciado em primeira mão o furacão Catarina. Estávamos nos dirigindo para a rádio e um amigo de Torres me ligou dizendo que fora grande a destruição. Pronto, passei das 7 até 9,30 entrevistando pessoas a respeito. A Gaúcha só começou a noticiar às 9 horas.
Nosso programa foi ao ar por seis maravilhosos anos. Acontece que nossa fazenda começou a crescer muito e o escritório também, de maneira que tinha que aproveitar sexta, sábado e domingo para cuidar dos negócios ( o olho do dono engorda o boi). Tive que parar o programa, do qual tenho ainda muita saudade.
Migrei, então, para a TV Pampa, participando do Pampa Debates e assessorando o Paulo Sérgio nas transmissões da Expointer.


quinta-feira, 13 de junho de 2019

ANDANÇAS POR RÁDIOS E TV II

Arroio do Meio era tudo de bom. Na época não dispunha de uma emissora de rádio, de sorte que não pude exercer  meus “pendores” jornalísticos. Após um ano fui promovido para a Comarca de Santiago, que estava vaga há dois anos.Junto com ela passei a jurisdicionar, por substituição, Jaguari e São Vicente do Sul. Após alguns meses as pilhas de processos parados haviam sumido dos armários, muito pela boa vontade do grupo seleto de advogados da época.
Santiago é uma cidade distante de quase tudo e, talvez por isso, fervilhava de cultura. Em pouco tempo me apresentaram o proprietário da Rádio Santiago, a única da cidade na época. Chamava-se Jaime Medeiros Pinto, uma das mais interessantes pessoas que já conheci.Poeta, músico, cantava muito bem. Eu participava assiduamente dos programas locais. Depois que fui promovido, fiquei muito tempo sem ir a Santiago. Vários anos após conheci minha “ campeirinha” Maristela, de renomada família local. Ela e eu fomos crescendo na pecuária e  acabamos comprando uma bela casa no centro da cidade, apesar de termos moradia em Porto Alegre.
A essa altura reencontrei um advogado de nome  Antônio Cocentino que era dono de uma nova rádio. A emissora era a FM Verdes Pampas, com 50 kw!  Cinquenta KW que faziam a emissora ser ouvida num raio enorme. Cocentino quis me vender a rádio, mas preferi fazer uma experiência: importar o sistema “ talk and news”, dando prioridade a entrevistas e notícias. Não funcionou, pois o povo estava acostumado a muita música, alguns recados e um monte de  anúncios.
Infelizmente pouco depois Cocentino faleceu num acidente.
Certo dia, estando  em vias de me aposentar, recebi convite para um programa na Rádio Pampa de Porto Alegre.Fui e gostei. Há tempos eu estranhava que Porto Alegre não tinha programa informativo nas manhãs de domingo. Na Gaúcha era o Nico Fagundes com o Galpão do Nativismo; na Guaíba eram tocadas músicas românticas, como até hoje. Na Pampa havia reprises de programas. Apresentei ao Paulo Sérgio Pinto, vice da Rede Pampa, o projeto de um programa que seria levado ao vivo, das 7 até 9,30 da manhã, aos domingos. Só faria entrevistas por telefone, máximo de cinco minutos, leria os recados mais interessantes, sendo  minha mulher e meu filho Rudolf  meus “ secretários”. Meu lema era: “ em rádio um segundo de vacilo e o ouvinte muda de estação”. Nome do programa: “ Pampa Grande do Sul”. Cortina:minha composição com letra de Nenito Sarturi, “ sóis de outono”.

No primeiro domingo em que foi ao ar, foi um “ balaço”.
( SEGUE)

sexta-feira, 7 de junho de 2019

JÁ PELAS TABELAS - AFIF JORGE SIMÕES NETO



Pedem-me otimismo, mas se fosse exigida de mim a oferta da dor causada pelo olho do machado, daria elas por elas. Não me venhas tu de novo com aquelas frases empacotadas, cheias de ecletismo. A sociedade aparvalhada quer saber apenas o que tens a oferecer de proveitoso, além do inútil palavreado sonoro, com cheiro de naftalina. Basta de púlpitos e tribunas. O homem foi embora de si, e se perdeu entre os mapas da navegação. O discurso virou uma atividade tão banal quanto as folhas secas que o outono vai varrendo para debaixo das árvores copadas.

A mulher do vilarejo, vinda de parto ocorrido na viatura policial, procura em vão o remédio para controlar a hemorragia uterina, medicamento que o político lhe prometeu perto do palanque. Se ninguém do povo exigiu nada, por que, então, se obrigar a tanto, argumenta o bem votado, enquanto se afasta da eleitora com a cautela própria dos covardes.

O velho sisudo, de rígida educação recebida em colégio de padre, crítico voraz dos maus costumes, entregou-se de vez à lábia da princesinha do lupanar. A doação em cartório da casa mobiliada e piscina com azulejo é mera retribuição ao simulado amor que Kelly Andressa sente por Amâncio. Os filhos havidos com a primeira mulher, e ela junto, que arranjem outro lugar para morar. Agora, as atenções mudaram de endereço, e a amásia já deixou claro para o provedor que não vai aceitar gente estranha abrigada sob a mesma carpintaria.

O jogo lancinante das paixões prossegue intenso sobre o pano nauseabundo das aparências. O gordo imprevisível e o salafrário encurralado pela jogatina desistiram das apostas, diante do adiantado estado de podridão do sentimento de piedade dedicado ao próximo.

É uma questão de tática a ser empregada no aperfeiçoamento dos negócios escusos, balbucia o da ponta da mesa, insinuando a derrota do amigo contendor, que deu uma saidinha. Foi ao banheiro, vomitar a última fatia de esperança que estava entalada na garganta.

Ninguém é um balaio de ternura. Mora em nós o lado perverso assimilado no contato das ruas. Ou, quem sabe, te imaginas diferente dos demais irmãos de reza e infortúnio? Por falar nisso, nunca é demais trazer à boca o segundo quarteto dos Versos Íntimos, de Augusto dos Anjos: Acostuma-te à lama que te espera!/O Homem, que, nesta terra miserável,/Mora, entre feras, sente inevitável/Necessidade de também ser fera.

À tardinha, escuta bem, ó distraído transeunte, o sino da igreja chamando desesperadamente os crédulos para a missa de corpo presente da senhora Dona Fé. Matou-se de tédio, desiludida face às últimas ocorrências.

quinta-feira, 6 de junho de 2019

ANDANÇAS POR RÁDIO E TV

Eu sempre tive fascínio pela comunicação. Em casa  passava ouvindo rádio. Eu devia ter uns 15 anos quando decidi falar com o sr. Bartholomay para ele me deixar ler uns comerciais.Em Santa Cruz só havia uma emissora que na época tinha o prefixo ZYE8. Havia uma caixinha na frente do microfone dentro da qual achavam-se cartões com textos datilografados. O papel do locutor era ler comerciais, dar a hora e a temperatura. Após isso o operador, do outro lado do vidro, dava um sinal e a gente anunciava a música que quase sempre era “ patrocinada”. Exemplo:
-alô , alô Maria  Clara que mora em Monte Alverne. Seu admirador Armindo lhe dedica a música “ que beijinho doce”. A rádio “ talk and news” só foi surgir bem mais tarde( notícias 24 horas, com música só por alguns segundos).
Quando me mudei para  Porto Alegre em 1964 apresentei-me na Rádio Continental. Ficava de locutor algumas horas, mas recebi uma proposta em outra atividade e larguei.
Ao assumir meu cargo de juiz de direito em Horizontina em 1972 ,uma das primeiras coisas que fui fazer foi visitar a Rádio Vera Cruz.Eu era o primeiro juiz a trabalhar na recém criada comarca. Passava dando entrevistas e gostava de explicar o papel do Judiciário.
Fato interessante: muita gente de Horizontina era procedente das “ colônias velhas”, o que englobava a região de Santa Cruz, Lajeado, etc. Horizontina confrontava com o Rio Uruguai.Acontece que do lado argentino as  terras eram mais baratas. Lá se ia o pessoal para o outro lado. Sucede que, por vezes, pessoas com pendências judiciais cíveis tinham ido embora. Era problemático mandar carta rogatória para os chamar. Não sei se eu faria isso hoje: eu pedia que a rádio desse, na hora do meio dia, uns avisos de que fulano estava sendo chamado para resolver assunto de seu interesse ( claro que não era matéria criminal). Pois não é que os colonos, que escutavam a rádio Vera Cruz, pegavam a barca, atravessavam de volta para o Brasil, andavam vinte quilômetros e se apresentavam? Era lindo de ver como já tinham uma entonação castelhana, mas a língua alemã continuava firme.
Terminada a audiência eu ficava conversando com essa gente maravilhosa. Muitos  estavam determinados a ficar na Argentina, mas diziam que jamais iriam torcer por outro time que não fosse Inter ou Grêmio.
Nas noites de solidão interminável eu escutava a LT4 Rádio Difusora Misiones. Foi quando conheci o belo folclore  argentino.

Eu adorava  Horizontina , mas quis ficar mais perto de meus pais. Me removi para a comarca de Arroio do Meio.
( CONTINUA).

CRÔNICA DE SÉRGIO AGRA

As “marias” do Brasil – Sergio Agra

AS “marias” DO BRASIL
Desconheço se as novas gerações conheçam as expressões “Marias Gasolinas” e “Marias Chuteiras”.
“Maria Gasolina” é a jovem adolescente ou mulher que só sai com homem que tenha carro, a famosa “gasosa”. É a mulher que não possui carro, ou que não tem condições de manter um, porém adora passear e estar dentro de um carro, na companhia de um homem, sem que o padrão da beleza masculina seja requisito.
Esse pejorativo não é novo, as “Marias Gasolinas” surgiram pouco após o lançamento do primeiro carro, por volta de 1885 na Alemanha. Com a evolução dos automóveis as “Maria Gasolinas” também evoluíram.
No Brasil, já que até o início dos anos 1960 era raro ter um automóvel próprio (os rapazes mais jovens sobreviviam na maré da condescendência paterna em lhes emprestar lamachina)  elas somente vieram a se notabilizar a partir daquela década.
Por essa razão, em Porto Alegre, diz a lenda, que das “fusquetas” a 120 km/hora rumo ao escurinho do canteiro de obras onde hoje é o Parque Moinhos de Vento, o Parcão, ouviam-se, não somente o ronco turbinado de seus motores, mas o “último suspiro das virgens”, firmemente seguras no conhecido Pu.. Mer… (uma espécie de gancho emborrachado, preso ao painel daqueles Sedans, em que o carona lograva segurar-se quando de uma brusca freada).
De outra banda, “Maria-Chuteira” é o estereótipo relacionado às mulheres quesão notórias por manter relacionamentos amorosos com jogadores de futebol. Elas são bonitas, saradas, ambiciosas e loucas por estes atletas profissionais. Algumas “Marias-Chuteiras”, consideradas profissionais, têm até empresários que agenciam a carreira e as levam para as festas certas. Antes, ligam para veículos de comunicação e avisam os fotógrafos para não perder a oportunidade de aparecer na mídia ao lado de um craque.
Um dos casos mais polêmicos, esdrúxulos e disparatados foi o casamento, num castelo na França e que custou, à época, perto de R$ 2,2 milhões,de Ronaldo Nazário e de Daniella Cicarelli, (que, apesar de apresentadora de TV e modelo, na foto posou como “Maria-Chuteira”). Três meses após anunciavam a separação.
Ainda sobre Ronaldo, o seu namoro com Susana Werner, mulher do goleiro Júlio César.
Muitas destas levaram jogadores de pouca instrução e estrutura quase à ruína, como foi o caso de um volante tricolor, Campeão da Libertadores e do Torneio Intercontinental (hoje o Campeonato Mundial Interclubes). Ao que parece, essa “escalada da fama” hoje se mostra mais imediata, mais instantânea.
Em episódio recente o superatleta Cristiano Ronaldo viu-se envolvido num processo judicial acusado de estupro, condenado a pagar uma indenização milionária à suposta vítima.
Após patrocinar à brasileira Najila Trindade Mendes de Souza uma viagem a Paris, hospedagem em hotel de luxo na capital francesa, com noites regadas a champanhas e generosíssimos vinhos, vinhos, o “menino” Neymar está sendo acusado de agressão e estupro pela mulher.
No jogo da seleção brasileira contra a do Qatar, na última quarta-feira, o atacante não permaneceu em campo por mais de 12 minutos. Lesionado, ao que tudo indica com gravidade, vê ameaçada sua partipação na Copa América.
Que grau se pode atribuir a essa lesão? Ela foi física? Foi emocional! Ninguém, à exceção de seus médicos, pode avaliar. Assim como o que se passa entre quatro paredes somente o celular é testemunha.
E, assim mesmo, corre-se o risco de ser fake new.