segunda-feira, 30 de outubro de 2017

REVENDO COLEGAS DE INTERNATO



Ainda estou me recuperando de tanta emoção. Ontem fui à minha terra natal, Santa Cruz, para um encontro de ex alunos do Colégio Santo Inácio. Esse colégio situava-se no Kappesberg, atual Salvador do Sul e recebia candidatos ao sacerdócio em regime de internato. Eu fui para lá com 13 anos. Só recebia visita de meus pais dia 31 de julho, dia de Santo Inácio e podia ir para casa em  janeiro e fevereiro. O Colégio era de altíssima excelência, bem administrado pelos Jesuítas, com sua conhecida disciplina.  Lá permaneci por dois anos, mas quero dizer que esse período influenciou toda a minha vida e, por isso, sou eternamente agradecido.
A confraternização ocorreu no pavilhão da Igreja Três Mártires.
Gerações e gerações de ex alunos compareceram. Fazia tempo que não comparecia a um evento tão cheio de pureza, amizade, recordações, tanto de idosos, como de homens mais jovens.
Pude rever colegas alguns dos quais não via há mais de 50 anos e conheci muitos jovens que foram inacianos e que permanecem com aquela centelha que fez a diferença em nossas vidas..
Parabéns a todos da comissão organizadora.
Nas fotos o Colégio Santo Inácio e na inferior  eu e um colega, Alceu Lau, que não via desde 1959.

quarta-feira, 25 de outubro de 2017

RECORDANDO MEUS TOMBOS DE A CAVALO I

   

Em minha carreira de " baiano" até que caí pouco dos cavalos. Foram quatro vezes. O único problema que a costela quebrada leva um tempão doendo. É igual a mordida de traíra no dedo da mão.
Eu sempre fui metido, porém não cheguei às raias da imprudência. Mas só depois fui me dar conta que a maioria dos campeiros e  peões têm uma linguagem cifrada que não pode ser levada ao pé da letra.
Por exemplo:  quando a chuva já é boa, mas falta mais, eles dizem que está garoando; quando um cavalo é manso para eles, para um urbano é um fogoso  corcel botando fogo pelas ventas.
Meu primeiro tombo foi assim: eu saí numa manhã de geada para ver uns terneiros do cedo que estavam nascendo. O capataz não estava e fui com um peão. Vimos uma vaca deitada, com o útero de fora e o terneirinho em redor da mãe. O peão me pediu que trocássemos de montaria porque a égua dele não ia deixar ele levar o terneirinho . Apeei, trocamos e alcancei a ele o terneiro de seus 35 kgs. recém nascido. Feito isso " amuntei" naquela desgranida. Não consegui me enforquilhar e nem colocar o pé no estribo do lado do laço e a filha da mãe saiu velhaqueando e disparando campofora. Eu tinha medo de sofrenar  aquela imundície de égua com medo que ela empinasse e caísse em cima de mim.  E a louca galopeando campofora. Até que consegui a conduzir para um cerro de pedras e pensei: " maldita, agora tu vai ralar as patinhas  ou te quebrar". Realmente ela sentiu a dor do pedregal e deu uma vacilada. Foi quando me atirei de cima dela.
A louca só foi parar uns dez kms depois. E eu estirado quase sem poder respirar, todo lastimado. Pedi para o peão ir até a sede da fazenda e para ele avisar Maristela vir de caminhonete juntar meus cacos .
Dei a bandida da égua num brique por outro cavalo sob os protestos da peonada que achava ela mansa.Prometi para minha família não cavalgar mais. Mas promessas são feitas para serem descumpridas, andar a cavalo dá um prazer quase genésico.
Depois conto os outros.

sexta-feira, 20 de outubro de 2017

VIVER COM MAIS QUALIDADE. ( JÁ ESTOU NESSA HÁ TEMPO)


O caminho de volta...  

 (Teta Barbosa - jornalista, publicitária e mora no Recife)

 

"Já estou voltando. Só tenho 45 anos e já estou fazendo o caminho de volta. Até o ano passado eu ainda estava indo... Indo morar no apartamento mais alto, do prédio mais alto, do bairro mais nobre.  Indo comprar o carro do ano, a bolsa de marca, a roupa da moda. Claro que para isso, durante o caminho de ida, eu fazia hora extra, fazia serão, fazia dos fins de semana eternas segundas-feiras.  Até que um dia, meu filho quase chamou a babá de mãe!  Mas, com quase cinquenta, eu estava chegando lá. Onde mesmo?  No que ninguém conseguiu responder. Eu imaginei que quando chegasse lá, ia ter uma placa com a palavra "fim".  Antes dela, avistei a placa de "retorno" e, nela mesmo, dei meia volta.  Comprei uma casa no campo (maneira chique de falar, mas ela é no meio do mato mesmo).  É longe que só a gota serena! Longe do prédio mais alto, do bairro mais chique, do carro mais novo, da hora extra, da babá quase mãe. Agora tenho menos dinheiro e mais filho. Menos marca e mais tempo.  E não é que meus pais (que quando eu morava no bairro nobre me visitaram quatro vezes em quatro anos), agora vêm pra cá todo fim de semana?  E meu filho anda de bicicleta, eu rego as plantas e meu marido descobriu que gosta de cozinhar (principalmente quando os ingredientes vêm da horta que ele mesmo plantou). Por aqui, quando chove, a Internet não chega. Fico torcendo que chova, porque é quando meu filho, espontaneamente (por falta do que fazer mesmo), abre um livro e, pasmem, lê.  E no que alguém diz: "a internet voltou!", já é tarde demais, porque o livro já está melhor que o Facebook, o Instagram e o Snapchat juntos. Aqui se chama "aldeia" e tal qual uma aldeia indígena, vira e mexe eu faço a dança da chuva, o chá com a planta, a rede de cama.  No São João, assamos milho na fogueira. Aos domingos, converso com os vizinhos. Nas segundas, vou trabalhar, contando as horas para voltar... Aí eu me lembro da placa "retorno", e acho que nela deveria ter um subtítulo que diz assim: "retorno – última chance de você salvar sua vida!"  Você, provavelmente, ainda está indo. Não é culpa sua. É culpa do comercial que disse: "Compre um e leve dois".  Nós, da banda de cá, esperamos sua visita.  Porque sim, mais dia menos dia, você também vai querer fazer o caminho de volta..."

terça-feira, 17 de outubro de 2017

SOBRE ALGUNS BOÇAIS E BURROS QUE POVOAM AS REDES SOCIAIS - artigo de tito guarniere


TITO GUARNIERE

INTERNET É BOM MAS É RUIM

Que a internet é o fenômeno essencial do nosso tempo, ninguém discute. Mas nem tudo reluz nos blogs, sites, redes sociais. A internet é um espaço privilegiado, de fácil e pronto acesso a informações preciosas e necessárias, opiniões abalizadas e de textos lúcidos que facilitam e melhoram a nossa vida. Mas ao mesmo tempo é espaço das "fake-news", dos militantes de causas exóticas, de cretinos operosos, das teorias conspiratórias mais improváveis, e onde hordas de ignorantes deitam e rolam com suas diatribes, bobagens e xingamentos.

A internet é um refúgio de pessoas (nem todas, graças a Deus!) que se julgam injustiçadas, preteridas, enganadas, de pessoas complexadas ou que simplesmente não têm nada para fazer. A rede é o território onde elas reinam e governam, quase sozinhas, e no qual o teclado cumpre todas suas vontades e ordens, e onde elas podem distribuir palpites no que entendem, e mais ainda no que não entendem.

Em cima, está exposto o artigo do jornalista, do comentarista, do autor especializado, em geral respeitando o vernáculo, a gramática, os acentos gráficos, com (alguma) base e fundamento, ainda que não se concorde com ele. Cá embaixo, em número assustador, no espaço do leitor, os comentários vulgares, os clichês surrados, as rotulagens fáceis, a desqualificação do autor. Dá para notar que o texto comentado não foi lido inteiro, ou se lido, não foi entendido. O internauta típico, um sujeito comumente de maus bofes, critica até autores e textos com os quais ele está de acordo.

Atenção, aqueles que queiram se aventurar a escrever na internet: evite a ironia. A massa dos internautas não sabe o que é ironia e toma o texto ao pé da letra. Quando usarem, anotem explicitamente que é ironia, mesmo sabendo que, então, não será mais ironia.

É rara uma observação pertinente sobre o texto, os argumentos do autor. Os comentários variam de simples a simplórios, descosturados, descontextualizados, aleatórios, às vezes. Quando respondem a um texto, são respostas simples e erradas. Querem ter direito à opinião e também aos fatos. Nas suas argumentações ignoram e distorcem as mais solares evidências.

É o tempo sombrio das "narrativas". Não importa o que está rolando, será sempre preciso enquadrar o fato na narrativa. A narrativa não é mais construída pelos fatos, suas causas e efeitos: os fatos é que devem ser construídos segundo a narrativa pré-existente.

O filósofo e matemático inglês Bertrand Russel já dizia na década de 50 que "o problema do mundo de hoje é que as pessoas inteligentes estão cheias de dúvidas, e as idiotas estão cheias de certeza". O número de idiotas é hoje muito maior e eles ainda podem ecoar as suas mensagens no mundo, através da internet. Pessoas que mal leram um livro, um artigo de fundo, um rodapé, deitam falação sobre temas que exigem um semestre inteiro de estudo.

Cuidado com as redes sociais: elas afetam a nossa sanidade. Winston Churchill, que sabia das coisas, disse uma vez que "o melhor argumento contra a democracia é a conversa de cinco minutos com um eleitor comum". Atenção: isto é uma ironia do primeiro-ministro britânico na II Guerra.

NO CAOS O DIREITO TEM POUCO A FAZER


Escrevo para uma maioria que é leiga nas filigranas jurídicas. Por isso procurarei ser didático. É que estamos todos assustados com a violência e a criminalidade que tomaram conta do Brasil. E aquele que acha que não é tão grave assim é que porque precisa viajar um pouco.  Por sinal, adora a frase “ ufanismo se cura com viagens” que vão ensinar que Deus não é tão brasileiro assim.

Todo o dia circulam, principalmente pelas redes sociais, urros e imprecações contra a Justiça, a Polícia, as leis brandas.  Sinto muito se vou decepcioná-los, mas o Direito não é , nem de longe, a panaceia para nossos males.

Pergunto: num condomínio em que todos são pessoas probas, calmas, honestas e bem intencionadas, não importando seu poder aquisitivo, será necessária uma longa convenção? Penso que não, mesmo por1que os mandamentos fundamentais de um convívio estão enraizadas na educação das pessoas e nas leis gerais. E um condomínio de pessoas brutas e mal intencionadas: adianta uma convenção pormenorizada com um quaquilhão de artigos e parágrafos?

Ensinaram-me na Alemanha, que é onde o mundo inteiro estuda a Filosofia do Direito, que uma sentença criminal contém vários momentos:
a) O Wahrspruch ( Wahr - verdade + Spruch - dito, pronúncia= vere+dito)
b) o Schuld( culpa) + Spruch + dito de culpa.
Segue-se daí que o juiz, depois de proclamar que os fatos  são verdadeiros, diz se o réu é culpado. Em consequência pode  agregar uma pena legal ou não. Com efeito, existem hipóteses em que desnecessária se torna a agregação de uma pena legal, eis que o fato ( Tat) já puniu o réu suficientemente ( daí, ne bis in idem). Exemplo: o pai que atropela e mata o próprio filho dando uma ré no carro e agindo com imprudência. Dada a morte do  filho, que é uma " poena naturalis", deixa de aplicar a pena legal.
O simples enunciado, estatalmente exarado, de ser o réu culpado não é um " nada" penal. Numa pessoa de bem causa um sofrimento grande.Mas essas considerações , nas quais se perquire no mundo jurídico, não têm cabida entre grosseiros e primatas.
Assim, enquanto um homem probo recusa-se a sair de casa depois de sofrer uma reprimenda do  juiz, já que não mais será considerado um homem honrado, isso nos países do hedonismo, da velhacaria,  não funciona.
Resumo: o que faz uma sociedade ser sadia é o espontâneo e consensual cumprimento voluntário das leis. Se todos nós decidirmos afrontar as normas acaba o Estado de Direito e começa a selvageria. Conclusão: a Justiça foi concebida para lidar em casos absolutamente excepcionais, com a enorme maioria cumprindo os contratos, adimplindo suas obrigações, não delinquindo.

Fora disso a Justiça não tem como ser efetiva.

 

sexta-feira, 13 de outubro de 2017

SOBRE A VIDA DE NOSSOS IRMÃOS ANIMAIS; MAILS DOS DRS.ROGERIO G. OLIVEIRA E EISEU GOMES TORRES


Andou bem o Ruy ao preservar a morada do João de Barro.

Aprendi com meu pai (cujo sítio chama-se João de Barro) que somos nós os invasores do espaço onde muito tempo antes já habitavam em paz os bichos.

E desde que não sejam nocivos à nossa saúde, temos que abrir-lhes espaço, conviver com eles e ainda compensá-los pela nossa presença nociva no território deles.

Em não raras vezes em que meu pai encontrou algum bicho no sítio, mesmo uma cobra ou aranha, sempre capturou o animal sem machucá-lo, levou-o até um local seguro para “ambas as partes” e lá o soltou. Tenho feito isso também minha vida toda. E acho que passei adiante o conceito, pois uma de minhas filhas é devotada de tal forma aos animais que se recusa a comê-los, tendo se tornado vegetariana.

Na verdade, na perspectiva dos bichos, nós humanos é que somos os estorvos, os destruidores, os que aniquilam a vida.  Por isso, muitos deles nos evitam ao máximo, porque somos asquerosos e perigosos.  

Durante alguns anos, auxiliei uma mãe sabiá que todo mês de setembro vinha fazer ninho aqui, sobre o mesmo palanque do estacionamento aos fundos do terreno do escritório, bem debaixo do canto de uma mesma telha metálica. No primeiro ano, devido ao calor do sol esquentando e se irradiando pela telha metálica, muito próxima ao ninho, ela perdeu um dos filhotes. A partir daí, passei a montar uma pequena cobertura de madeira sobre aquela parte da telha, com um segundo telhado, impedindo que a telha esquentasse. Fazia isso sempre ao primeiro sinal de construção do ninho. A zelosa mãe sabiá parece que acostumou-se com minha presença ocasional. E fomos nesta lida durante uns 5 anos: ela sempre vindo fazer o ninho em setembro, no mesmíssimo lugar, sempre chocando e criando os seus dois filhotes, alimentando-os até sumirem depois das aulas de voo. Este é o segundo setembro que aquela mãe sabiá não dá o ar da sua graça por aqui. Talvez tenha encerrado seu ciclo de vida. Uma pena. Já estava acostumado com a convivência e parceira. Abrç, Rogério
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Quando o João de Barro escolhe tua casa para nela assentar a sua, iss0 é bom presságio. Não esqueçamos que o Barreiro é um legitimo arquiteto natural. Tem divisões em sua casinha e a entrada faz frente para o lado de 0nde não virão tempestades. E, finalmente, a tessitura de um ninho feit0 de barro e pequenos gravetos, é quase indestrutivel. Sacá-lo de lá pela força, é ato que viola a natureza. Por isso, parabéns, amigo Ru y.
 
 
 

quarta-feira, 11 de outubro de 2017

PENA DE MORTE AO JOÃO DE BARRO





Há pouco chamei um senhor para fazer um pequeno conserto em minha casa.
Lá pelas tantas ele vislumbrou que, numa janela do segundo piso, um joão de barro  concluia sua casa . Ele e sua companheira. E que eles deixavam restos de sua massa nas paredes recém pintadas e outro tanto no chão.
- o sr.não quer que eu  suba lá com uma escada e tire fora esse ninho e essa sujeira? É 30 pilas!
Minha primeira reação foi de ir na casa dele e a destruir. Mas, como sou um menino bem educado perguntei:
- o que esse bichinho fez contra o senhor?
-??
- Seu João, esses bichinhos têm tanto direito a viver aqui na Terra como nós, os sacanas que ainda vão exterminar com o planeta.
Seu João pegou suas ferramentas, mais o dinheiro pelo conserto e antes de entrar no seu carro me perguntou:
- o sr. está bem , seu Ruy?

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

UM RECADO AOS PAIS QUE CULPAM PROFESSORES


É *EM CASA* que as crianças devem aprender a dizer: 

 

01 - Bom Dia

02 - Boa Tarde

03 - Boa Noite

04 - Por Favor

05 - Com Licença

06 - Me Desculpe

07 - Me Perdoe

08 - Muito Obrigado

09 - Grato

10 - Errei

 

É *EM CASA* que também se aprende:

 

01 - Ser honesto

02 - Ser pontual

03 - Não xingar

04 - Ser solidário

05 - Respeitar a todos: amigos, colegas, idosos, professores, autoridades

 

Também *EM CASA* é que se aprende: 

 

01 - A comer de tudo

02 - A não falar de boca cheia

03 - A ter higiene pessoal

04 - A não jogar o lixo no chão

05 - Ajudar os pais nas tarefas diárias

06 - A não pegar o que não é seu

 

Ainda *EM CASA* é que se aprende:

 

01 - A ser organizado

02 -  A cuidar das suas coisas

03 - Não mexer nas coisas dos outros

04 - Respeitar regras, usos e costumes

05 - *Amar a Deus*

 

Porque *NA ESCOLA* os professores devem ensinar:

 

■ Matemática

■ Português

■ História

■ Geografia

■ Língua Estrangeira

■ Ciências

■ Química

■ Física

■ Biologia

■ Filosofia

■ Sociologia

■ Educação Física

■ Artes

 

E apenas reforçam o que o aluno aprendeu *EM CASA*!!!
( RECEBI PELA INTERNET)

domingo, 8 de outubro de 2017

TEXTO INTERESSANTE DE MARINA COLASANTI

Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia   -  Marina Colasanti  
A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E, porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E, porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E, porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a luz. E, à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.
A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora. A tomar o café correndo porque está atrasado. A ler o jornal no ônibus porque não pode perder o tempo da viagem. A comer sanduíche porque não dá para almoçar. A sair do trabalho porque já é noite. A cochilar no ônibus porque está cansado. A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.
A gente se acostuma a abrir o jornal e a ler sobre a guerra. E, aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja números para os mortos. E, aceitando os números, aceita não acreditar nas negociações de paz. E, não acreditando nas negociações de paz, aceita ler todo dia da guerra, dos números, da longa duração.
A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir. A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta. A ser ignorado quando precisava tanto ser visto.
A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita. E a lutar para ganhar o dinheiro com que pagar. E a ganhar menos do que precisa. E a fazer fila para pagar. E a pagar mais do que as coisas valem. E a saber que cada vez pagar mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar nas filas em que se cobra.
A gente se acostuma a andar na rua e ver cartazes. A abrir as revistas e ver anúncios. A ligar a televisão e assistir a comerciais. A ir ao cinema e engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.
A gente se acostuma à poluição. Às salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro. À luz artificial de ligeiro tremor. Ao choque que os olhos levam na luz natural. Às bactérias da água potável. À contaminação da água do mar. À lenta morte dos rios. Se acostuma a não ouvir passarinho, a não ter galo de madrugada, a temer a hidrofobia dos cães, a não colher fruta no pé, a não ter sequer uma planta.
A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá. Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço. Se a praia está contaminada, a gente molha só os pés e sua no resto do corpo. Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana. E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado.
A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele. Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se de faca e baioneta, para poupar o peito. A gente se acostuma para poupar a vida. Que aos poucos se gasta, e que, gasta de tanto acostumar, se perde de si mesma.


Marina Colasanti nasceu em Asmara, Etiópia, morou 11 anos na Itália e desde então vive no Brasil. Publicou vários livros de contos, crônicas, poemas e histórias infantis. Recebeu o Prêmio Jabuti com Eu sei mas não devia e também por Rota de Colisão. Dentre outros escreveu E por falar em Amor; Contos de Amor Rasgados; Aqui entre nós, Intimidade Pública, Eu Sozinha, Zooilógico, A Morada do Ser, A nova Mulher, Mulher daqui pra Frente e O leopardo é um animal delicado. Escreve, também, para revistas femininas e constantemente é convidada para cursos e palestras em todo o Brasil. É casada com o escritor e poeta Affonso Romano de Sant'Anna

quarta-feira, 4 de outubro de 2017

CÓDIGO IMPLICITO - ARTIGAÇO DE STAVROS FRANGOULIDIS


Aqui no Brasil, diferente dos Estados Unidos, não há tolerância com a arrogância nos negócios.

Lá é normal uma pessoa se vangloriar dos seus sucessos, ostentar suas conquistas e posicionar-se como um vencedor.

Aqui, se você fizer isso, é trucidado.

Então temos por aqui um código implícito que pouco tem a ver com aquilo que lemos nos livros de vendas e vemos nos filmes que tratam de negócios.

Algumas diferenças entre as duas culturas.

1. Objetividade

Por aqui você deve agir sem muita objetividade e usar um pouco de rodeios antes de entrar no assunto em si.

Acontece que muitas vezes essa fase de falar de tudo menos do que interessa toma tempo demais e isso é ruim para quem está na mesa.

Dentro da objetividade, que é um tópico mais complexo, eu encaixaria a falta de foco, foco esse que ambos os interlocutores tem que preservar pelo seu bem comum.

Mas como no nosso código social, precisamos falar de tudo menos do que interessa, para "esquentar a conversa" então o foco fica escondido sob algumas gordas camadas de dispersão que somente diluem sua energia.

2. Dinheiro e valores

Aqui no Brasil a questão do quanto vale ou quanto você ganha ou quanto eu cobro é tratada com todo cuidado.

Parece que falar de dinheiro por aqui é um tabu, quase uma vergonha.

Mas sabe de uma coisa? Isso não é somente por aqui não. Lembro de um empresário grego que queria vender seus serviços de turismo aqui e falei na lata quanto custaria para ele fazer uma campanha de captação de agência de turismo.

Falei logo no primeiro call. Ele ficou ofendido. Fazer o que..?

Prefiro falar logo do que gastar 8 reuniões até chegar na questão de valores e orçamento para aí sim a pessoa se ofender (geralmente fazem isso sumindo, depois de receber uma proposta).

Não sei as origens desse comportamento, mas também me sinto desconfortável em dizer na lata quanto valem meus serviços. Incrível isso, mas 30 anos operando à luz do mesmo código, você acaba sendo sua amostra mais perfeita.

De toda forma, mesmo desconfortável, falo de valores logo no primeiro encontro ou no máximo no segundo.

3. Sucesso

Aí que eu vejo a maior diferença entre culturas nos negócios. Aqui no nosso país, se você fizer sucesso, vai incomodar muita gente, inclusive dentro da sua casa.

Preto no branco: Sucesso agride. E aqui não digo apenas sucesso financeiro. Digo do seu sucesso pessoal, que pode ser um diploma, uma promoção, um novo emprego, uma nova habilidade, um reconhecimento, enfim tudo aquilo que você lutou para conseguir.

Ao conseguir, se você brandir para o universo a sua conquista, será invejado(a).

Até aí tudo bem. Isso é humano. Mas por aqui, creio que seja extrapolado.

Alardeie suas conquistas e prepare-se para lidar com uma legião de haters.

Não que alardear suas conquistas seja algo produtivo, mas é exagerada a reação dos odiadores.

Acredito que não agregue a ninguém você se auto promover, pelo contrário, reduz sua imagem.

Nos negócios, que é uma questão de confiança, você deve se posicionar e ser (importante isso) como alguém que pensa e age para o sucesso do seu cliente ou da empresa na qual você trabalha.

Aí sim, você será considerado. Pense nisso. Essa é uma mudança profunda que você pode buscar para ampliar seu raio de ação.

A partir do momento que seu sucesso advém como fruto do sucesso de quem você preza, você terá uma legião de adoradores.

Agora, com relação ao público externo, esqueça. Sempre haverá críticos e odiadores, por conta da pura inveja.

Mas enquanto o cães ladram, a caravana passa.

4. Retornos e atrasos

Melhorou nos últimos anos, mas por aqui no Brasil, chegar atrasado meia hora para uma reunião era normal (sabe como é o trânsito, né?).

Nunca me conformei com isso. Eu saio e chego na maioria das vezes com meia hora de antecedência e chego a passar vergonha por ter chegado tão mais cedo.

Prefiro isso, do que chegar atrasado para um encontro.

E essa mania de f...-se que a maioria age, não é só nos negócios, é na vida familiar e pessoal. Parece que por aqu, o tempo dos outros vale menos.

Isso tem a ver muito com a nossa cultura de baixa empatia, baixa solidariedade, baixa compaixão, baixa auto estima.

Mas melhorou muito nos últimos 10 anos. Ainda há atrasos em tudo (em chegar na hora certa, em dar o retorno, em entregar um serviço) mas bem menor do que antes. Pelo menos essa é a minha sensação.

5. Conhecimento e intelectualidade

Ser professor por aqui é sinal de ser um trabalhador sofredor que ganha pouco e ensina mal.

Não ensinamos dentro de casa aos nossos filhos o respeito devido aos outros e principalmente aos pais e professores.

Na Grécia, nós beijávamos as mãos dos nossos professores, pais e autoridades religiosas. Você deve aprender a se curvar frente à uma autoridade. Isso é fundamental para a formação do caráter e senso de civismo.

Aqui uma pessoa que anda com carro de luxo é tida como mais bem sucedida que uma pessoa que fez doutorado ou concluiu um MBA. Ambos não se deve ostentar, pelo que mencionei acima, mas dar publicidade aos seus bens materiais é tido como um sinal de "cheguei lá e você não."

Escrever um livro, dar aula em uma faculdade renomada, proferir palestras, defender teses, ou seja, dar publicidade a sua atividade intelectual também causa desconforto a outrem. É tido como um sinal de "eu ensino e você não".

Bem, nosso código é imperfeito, mas é esse.

Morei na Europa, onde me alfabetizei na Grécia e nos Estados Unidos, onde trabalhei como carregador de móveis para sustentar meus estudos.

Sou brasileiro e por mais que você tenha dificuldade em acreditar nisso, tenho muito orgulho do nosso país.

Somos o celeiro do mundo. Sim, não exportamos tecnologia. Exportamos comida. É mais importante.

Esqueça o noticiário. Não vai te ajudar em muita coisa.

Crie seu código de conduta pessoal e coloque as melhores pessoas nos seus raios de ação mais próximos e cresça.

A soberba precede a destruição.

Humildade, foco, trabalho árduo que chegaremos lá. E deixe falarem.
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terça-feira, 3 de outubro de 2017

ACIMA DA LEI - POR TITO GUARNIERE


 

ACIMA DA LEI

A decisão da 2a. turma do Supremo Tribunal Federal de suspender o mandato de Aécio Neves e de decretar a prisão domiciliar noturna do senador, foi uma patuscada e tanto. Deve-se esperar sempre da Corte Suprema um papel proeminente na preservação da ordem legal e institucional. Mas de vez em quando, ao invés de atuar em favor da harmonia e equilíbrio entre os poderes, de trazer calma ao ambiente institucional, derrapa feio, e se torna um fator a mais na instabilidade do país.

Merecidamente, os autores da decisão, ministros Barroso, Fux e Rosa Weber, recebem críticas severas de todos os lados, de editoriais como do jornal O Estado de São Paulo, de juristas como o ex-ministro do STF Carlos Velloso, de jornalistas como Demétrio Magnoli e Hélio Schwartsmann, da Folha de São Paulo.

Note-se que as críticas não se destinam a defender o senador do PSDB. O entendimento da maioria é o de ele ter, sim, contas a prestar à Justiça, no caso em pauta. Mas daí ao Tribunal criar figuras não previstas da lei, como a suspensão de mandato parlamentar e a prisão domiciliar noturna, vai descomunal distância, que nem um estagiário de Direito ousaria enunciar.

Há juízes, como Fux e Barroso, que não se comprazem em decidir nos termos estritos da lei. Preferem seguir as próprias convicções ou atender aos "clamores da sociedade". Mas na democracia, no estado democrático de direito, as leis existem entre outras e relevantes razões exatamente para isso: para que os juízes, quando chamados a decidir, tomem por base a existência e o conteúdo do respectivo texto legal.

Obviamente, o juiz pode ter vontade individual, visão de mundo, convicções. Mas na hora de decidir deve abstrair delas, em nome da soberania da lei. Os "clamores da sociedade", embora respeitáveis - são parte da democracia -, não podem se sobrepor ao que está escrito no texto legal.

Todo o arcabouço legal está assentado sobre esses conceitos basilares, que o aluno de Direito aprende no primeiro ano de faculdade. Porém certos juízes, ministros dos tribunais superiores e procuradores do Ministério Público ou faltaram às aulas quando a matéria foi lecionada ou não aprenderam a lição fundamental. Atuam de forma voluntariosa, imprudente, sem medir consequências. O aparato das leis, para eles, é insuficiente. Colocam os seus postulados de ordem moral, ideológica e política acima das leis. Investem-se da prerrogativa de legislar e criar o direito. Jogam para a mídia, a torcida.

Os ativistas do Judiciário decidem, às vezes, sem a lei e até contra a lei, mas sempre em nome de objetivos nobres: o combate à corrupção, a proteção dos mais fracos, o desequilíbrio entre as partes. Mas todas as leis são escritas com objetivos nobres! Fux e Barroso, dentre outros, talvez considerem as leis vigentes imperfeitas para a grandeza de sua missão, para a sede de justiça que imaginam possuir.

É claro que situações assim não prevalecem. Vão ser corrigidas à frente, no Senado ou no próprio STF. Mas foi uma lambança artificial, desnecessária, porque alguns iluminados se acham acima da lei e capazes de fazer melhor do que ela.

domingo, 1 de outubro de 2017

FILA E DEMOCRACIA

Meu filho Rudolf acaba de me presentear o livro Fila e Democracia, de Roberto da Matta e Alberto Junqueira. Está indo bem esse piá, dando valor a livros e não a futilidades.
O livro tem cerca de 120 páginas, mas é denso qual uma estrela-nova.
São incrivelmente interessantes as considerações sobre esse fenômeno humano da fila: para pagar contas, para passar pela caixa do supermercado, para inscrição num concurso. Daí o nojo que nos dá o " furar" uma fila, ou " comprar" um lugar nela.
Como  consta do livro: se a fila é uma invenção, como ela aconteceu? Quem a criou e quando surgiu?
O livro é uma bela oportunidade de presente: entre pessoas inteligentes , coisa lógica.