quinta-feira, 11 de julho de 2019

SOBRE AS DECLARAÇÕES RECENTES DE FRAU MERKEL


Penso,  pedindo antecipadas desculpas a quem discorde, que a Alemanha não está em condições, como nenhum país está, de censurar nosso presidente, que recém foi empossado no cargo, com o apoio de milhões de brasileiros.
Recentemente a renomadarevista Der Spiegel publicou ampla reportagem sob o título  “die fettenJahre sind vorbei” em tradução livre: “os anos gordos se foram”. Num subtítulo consta “ wir sind ärmer, als wir meinen” ( somos mais pobres do que pensamos”). E em outro parágrafo: “gastamos mais dinheiro com o passado do que com ofuturo”.
Como é bem de ver, a situação não é de otimismo, pois já ouvi de várias pessoas que a Alemanha tem dificuldades.
Creio que os alemães superaram um pouco o “Schuldkomplex” ( complexo de culpa)por causa das duas guerras em 50 anos .É difícil entender como ir para uma guerra quando, mesmo que vencessem, não teriam paz, nem futuro. 
Lembro-me bem que há poucos anos os atletas da seleção alemã não cantavam seu hino nacional, por medo,segundo concluo, de serem nacionalistas em excesso.  Por sinal, só cantam o último verso, abandonando, com razão o “Deutschland über alles”. Ainda bem que permaneceram com  um dos movimentos do Quarteto do Imperador de Joseph Hayden, que é a música do hino alemão.
No momento em que o Brasil quer parcerias, quer voltar a crescer, a senhora Merkel manifesta sua desconfiança de que vamos acabar com  o pulmão do mundo.
 Argumentam que, junto com a Noruega, a Alemanha manda muito dinheiro para que a Amazônia não seja dilapidada. Não saberia dizer se esse dinheiro vai para as mal explicadas ONGs ou o que. O que é óbvio é que nosso país não tolera interferências em sua plena soberania sobre seu território.
Nossas leis ambientais são rigorosas. Claro que há problemas na Amazônia, mas isso não quer dizer que queiramos sua destruição.
Por essa razão lamento, como descendente de alemães, que a senhora Merkel não tenha sido mais prudente e cuidadosa. Somos um povo afável, bom de dialogar.
O Brasil tem tudo: rios,cachoeiras, pecuária, soja e demais grãos, enormes áreas que permitem produção de alimentos naturais em escala,  riquezas que poucos países têm. Mais:tem  alegria!
Quando o avanço da tecnologia for corriqueiro, a briga vai ser por água e alimentos. O Brasil agora é um ótimo parceiro . E a Alemanha também o é. Parceiros não devem brigar.
Hostilizar um chefe de Estado não é bom negócio.

domingo, 7 de julho de 2019

O homem na Lua e muita gente nua - Flávio Tavares




O homem na Lua
 e muita gente nua
     FLÁVIO  TAVARES*

O  cinquentenário da chegada do homem à Lua, no próximo 20 de julho, não é apenas data de festa e júbilo pelo que a ciência e a tecnologia alcançaram. O maior e mais admirável feito da História humana nos obriga, também, a uma profunda reflexão crítica sobre o comportamento e a atividade de cada um de nós, habitantes do planeta: o que aprendemos com aquela façanha de amor e dedicação à ciência, ou de que nos serve no dia a dia?

    A própria ciência tem centenas de respostas, desde a antevisão de desastres naturais até as previsões da meteorologia, além do que descobre aos poucos, ao entender o universo.

   Nosso humanismo, porém, pouco – ou nada, até – aproveitou para valorizar nossa vida na Terra a partir da comprovação da desolação da Lua, onde tudo é inércia e morte. Aqui, onde a água dá cor à vida, tratamos o planeta com desprezo, como se a natureza não nos protegesse e nossos semelhantes fossem indesejáveis intrusos.

  Fui um dos bilhões de habitantes da Terra que, naquela madrugada do domingo 20 de julho de 1969, assistiram ao vivo, pela televisão, aquilo que mais parecia o deslumbramento de um sonho fantástico. Até então, a inatingível Lua só era perscrutada pelos telescópios. Ou era, apenas, um relato poético, um Sol noturno dos namoros apaixonados. “Levar-te-ei à Lua!”, exclamavam os namorados (assim, em mesóclise), no êxtase da paixão.

   Naquele momento, a façanha da astronáutica mudava a correlação de forças na “guerra fria” e os Estados Unidos passavam à frente da União Soviética. Doze anos antes os russos haviam lançado o Sputnik e em 1961 Iuri Gagarin fizera o primeiro voo espacial. Naqueles tempos de 1950-1970, tudo se circunscrevia à disputa entre as duas superpotências e isso fez a repercussão política do feito superar a visão humana e da ciência.

   Hoje, a cada dia mais sabemos da desolação lunar. As fases da Lua ganharam suportes científicos que explicam sua influência na Terra. Assim, a todo instante o universo e o Sistema Solar passam, também, a fazer parte da nossa vida. A astronomia tem nova e mais ampla dimensão. Se ainda indagamos os astrólogos para saber do amanhã, é apenas por nosso apego ao lúdico, esse atávico amor ao inesperado, originado na tradição e em nosso apego à fantasia.

  Não aprendemos, porém, a grande lição de o ser humano ter pisado na Lua. Em vez de tentar entender o universo, ou em vez de nos sentirmos pequenos ante ele, a cada dia destruímos nosso planeta, obra suprema do processo da Criação.

    Nos últimos cem anos, em nome do “progresso”, devastamos a Terra muito mais do que a destruição acumulada ao longo dos bilhões de anos do planeta. Sabemos que o aquecimento global é catastrófico e que as mudanças climáticas nos levarão a uma desolação comparável à da Lua, mas permanecemos praticamente inertes. Seduzidos pela cobiça e por suas prazerosas pequenezes, continuamos a desmatar imensas áreas verdes, como a Amazônia. Ou a poluir e degradar terras, águas e ar, como em Brumadinho ou em Mariana.

    A extração e o uso dos combustíveis fósseis – em especial, o carvão – são apontados pela ciência como os principais responsáveis pela hecatombe do aquecimento global. Com base nessa constatação, as reuniões intergovernamentais promovidas pela ONU vêm advertindo para o horror à vista e fixando datas e metas para evitá-lo, ou acertando acordos sobre o clima. O de Paris, mais recente, ampliou o que fora acertado já em 1992 na cúpula de chefes de Estado no Rio de Janeiro. O papa Francisco aprofundou o debate na encíclica Laudato Si’, fez a teologia tocar no tema fundamental – a vida – num alerta que ele próprio renova a cada momento.

    A série de intermináveis pequenezes do dia a dia, porém, desvia nosso olhar do essencial e vemos tudo sem enxergar nada. É como anoitecer ao meio dia, à luz do Sol, e usar lanterna ou lampião para vislumbrar o próprio rosto.

    Imprensa, rádio e televisão mostram, todo dia, nosso desdém pela natureza, que é vida em si. As geleiras derretem-se na Groenlândia e no Himalaia. Na Antártida, no inverno do Hemisfério Sul, a terra preta mostra que o gelo sumiu.

   O desdém irresponsável torna-se criminoso também aqui, ao nosso redor. A poucos quilômetros da nascente, as águas do rio Tietê estão infestadas de espuma branca industrial, num horror antes visível apenas na cidade de São Paulo. A Petrobrás e as demais petroleiras que exploram o nosso litoral jogam no oceano (sem nenhum tratamento) o equivalente a mais de 2 mil caminhões de cascalho e areia encharcados de óleo, por ano. E o fundo marítimo se infesta de HPA, um hidrocarboneto de alto poder cancerígeno.

       Como serão os segredos devastadores da exploração do nosso pré-sal?

    Ao norte do País, a cobiça continua a desmatar a Amazônia. Agora o atual governo nos expõe ao ridículo espetáculo circense de que a Alemanha e a Noruega tenham de “convencer” nosso ministro do Meio Ambiente a proteger nossa floresta. Ao sul, o projeto de uma mina de carvão a céu aberto degradará, em poucos anos, o rio Guaíba, que abastece a capital gaúcha.

    Somos o país que mais consome agrotóxicos, permitindo aqui até pesticidas proibidos na Europa e nos Estados Unidos. A lista de nosso irresponsabilidade é longa, sempre incompleta por ser interminável...
      Faz 50 anos, ciência e tecnologia levaram o homem à Lua. Não aprendemos, porém, a viver em paz e em solidariedade. Somos difusos e complicados, ternos e brutais. As religiões e filosofias surgiram para nos emendar ou regenerar, mas o delírio da condição humana não se dissipou.
     Hoje conhecemos a Lua, mas cada vez há mais gente vivendo na rua, ignorando o mundo, às vezes quase nua.
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*  JORNALISTA E ESCRITOR, PRÊMIO JABUTI DE LITERATURA EM  2000 E 2005, PRÊMIO APCA EM 2004, É PROFESSOR APOSENTADO DA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
 (Por especial e honroso pedido do dr. Franklin Cunha)

sexta-feira, 5 de julho de 2019

COMENTÁRIO DO ACADÊMICO FRANKLIN CUNHA


O Padre Clovis Lugon, jesuíta suíço, escreveu um livro que sugiro  sua leitura por quem se interessa pelo tema oportunamente exposto pelo Dr. J.F.Rogowski.
“ A República  “Comunista” Cristã dos Guaranis , 1610-1768, Editora Vozes.
Sempre que sou abordado por um indiozito  tremendo de frio e me oferecendo cestinhas de vime para comprar um pão,
lembro-me da República Guarani e  de sua violenta e anti-cristã destruição por parte dos reinos da Espanha e de Portugal. Tratava-se de um exemplo que corria o risco de se propagar e ameaçar os dois impérios invasores e predadores  da América.
Sursum corda !!
Franklin Cunha


CRÔNICA DO JURISTA E TEÓLOGO ROGOWSKI

Ainda bem que hodiernamente se têm consciência acerca da contribuição que os africanos deram ao Brasil, mas olvida-se a questão indígena, máxime, em nosso Estado (RS), cuja história é riquíssima com a epopeia dos  Charruas, Minuanos e Guenoas.
Certa feita solicitei a um candidato quando em campanha para vereador em Porto Alegre, que visitasse um alojamento indígena no bairro Vila Nova, zona sul, e ali constatasse a penúria em que eles vivem, produzindo algum artesanato vendido nos semáforos por crianças que, um pouco vendem, outro tanto pedem esmolas.
O candidato desatendeu minha sugestão e não se elegeu, ninguém mais quer assumir uma bandeira de luta, compromisso com uma causa meritória e autêntica, miram somente em seus projetos pessoais, por isso, tanta rejeição do povo à classe política.
E pensar que através da educação ministrada pelos jesuítas floresceram os sete povos das missões com um nível cultural muito acima do dito "homem civilizado".
Grandes artistas da música, pintura, escultura se revelaram em meio aos indígenas, bem como, aflorou-lhes um senso de empreendedorismo comunitário, obviamente, tudo ensinado pelos Padres, daí a ideia da criação e comércio de mulas, transporte de cargas, produção da erva mate para abastecer o Estado e os países platinos.
Talvez os Padres só olvidaram uma coisa, as advertências bíblicas, "vigiai e orai", "orai sem cessar", pois, sempre me pareceu que grandes projetos nascidos do coração de Deus para abençoar milhares de pessoas logo são atacados pelo maligno e acabam malogrando, não raro de maneira trágica, com muita violência e derramamento de sangue como aconteceu na Guerra Guaranítica (1750 - 1756) com  o massacre dos índios.
Uma das mais instigantes teses científicas da atualidade, os "campos mórficos", proposta pelo cientista inglês Rupert Sheldrake, segundo a qual os campos mórficos são estruturas que armazenam informações (têm memória) e  se estendem no espaço-tempo, portanto, não me espantaria se o que visses foi de fato uma "assombração", ou seja, uma "gravação", um registro dimensional no espaço-tempo, porém, o que me assombra e assusta de verdade,  é o descaso com a história e a questão indígena gaúcha.

quinta-feira, 4 de julho de 2019

TAPERAS E SEUS MISTÉRIOS





Vou embolar dois assuntos.
1)“Cuando se abandona el pago, tira el caballo adelante y el alma tira pa’ trás.”
É assim que nascem as taperas, os ocupantes das casas as abandonam, o cavalo puxa para frente, mas a alma puxa para trás.
Nos nossos campos há várias taperas.Mas lá, perdida no meio de uma invernada de campo nativo, há uma  especial. Me disseram que ali moravam fantasmas. Ainda restam algumas paredes. A casa era de pedras superpostas, com amálgama de barro. O  telhado ruiu ou foi levado pelo vento e o mato tomou conta. Um dia, numa linda tarde de domingo, decidi ir solito até a tal tapera, montado no meu cavalo Poeta.
Cheguei, apeei do cavalo e me estirei sobre a relva macia. Acabei adormecendo. Senti uma espécie de inquietude que acelerou meu coração. Me deu a impressão de que via, num átimo,uma jovem descendo a vereda, pelo trilhozinho, em direção à sanga, com um balde. Tinha longos cabelos negros, usava um xale de lã crua, calçava chancletas de couro cru.Percebi a voz de um homem com sotaque castelhano. Ela implorava que ele ficasse no rancho pois "diz que" andavam degolando sem piedade por aí...
Abri os olhos. Voltei à realidade.Teria sido o vento ,que causava assovios no taquaral, imitando vozes?Seriam as almas penadas ocupando a tapera?Ou apenas um sonho?
2)É certo que os campos dessa região já foram habitados por índios guaranis, fugidos da perseguição do homem branco, tentando salvar seu modo viver.
No riacho Itacurubi, que hoje dá nome a um pequeno município encostado em Unistalda,teria sido  morto o índio e lider Andresito Guazurari. O meu querido amigo Nico Fagundes, que tantas vezes me honrou com sua estada na minha estância, era um admirador desse heróico defensor de  seu povo. Levei, certo dia,Nico  até o outro lado de São Borja, a Santo Tomé,Corrientes, onde há um enorme monumento em honra de Guazurari. Nico,inclusive, deu o nome de Andresito a seu filho mais novo.
Guazurari é venerado nas províncias de Misiones, Corrientes e na região missioneira do RGS. Lutava pelo seu povo que queria continuar livre, com seus costumes e seus deuses.
Nossa História missioneira é pouco estudada no RGS, ao contrário da outra margem do Rio Uruguai.
Lí, não me lembro onde, que um cacique teria dito ao padre que o queria converter: “ o problema é que o deus de vocês é muito brabo”.