quinta-feira, 26 de setembro de 2019

AS PERDIZES SALVADORAS


Na região da campanha, até alguns anos, era comum a caça de lebres, perdizes, pacas, jacus, marrecas, pombas, quase tudo, enfim, de que se mexesse. Quase todos tinham armas de caça. Até eu tinha duas, uma calibre 12 e outra calibre 20. Os campos eram, como ainda hoje, muito extensos. 
Quero deixar claro que mais tarde nunca deixei caçar nos campos da nossa família. Inclusive a queridos amigos negava a entrada. Até brincava, “se teu problema é carne, vamos carnear um chibo (cordeiro)”. Nem pescar não deixava. Todavia  uma noite antes da sexta-feira santa não tem jeito. Tudo bem, é fazer de conta que não se vê  nada, mesmo porque não há como fiscalizar ou montar guarda  ante quase 40 açudes.
Mas voltemos aos anos 60 e 70. Era comum se ver carros voltando das caçadas com os bichos “ornando” as portas e os tetos . 
Naquela época eu até caçava,mas sempre dentro da quota. Depois de um tempo, quando casei com Maristela e juntos tocamos a fazenda, é que eu vi como era daninha a caça e me tornei um conservacionista.
Certa feita, logo que assumi em Santiago, lá por 1975, fui convidado para comer uma perdizada no sítio de um forte fazendeiro de um município vizinho, que usava o refúgio para suas festas. Seria num sábado à noite. Era verão e o homem tinha até piscina, coisa rara naqueles tempos.Estavam convidadas também umas meninas faceiras que seriam trazidas lá de São Borja, fato que eu desconhecia antes de chegar.
Um amigo meu, que era casado,o Carlos, teve dificuldades em explicar para a esposa da razão de ser festa só de homens, ao que ele retrucou que ia ser caçada com pescaria e só voltaria dia seguinte. Mas a esposa choramingava perguntando porque o esposo tinha se barbeado e perfumado. Peguei carona com meu amigo e nos fomos. Chegados ao sítio as perdizes estavam preparadas, com saladas e tudo que era coisa boa,em grandes e finas travessas. Por “mala suerte” as meninas não puderem ir e deu um temporal bagual, assim que só vieram cinco dos 40 homens convidados. Não ía sair a festa. Ao que tive uma idéia: “Carlos, vamos pedir e pegar umas travessas dessas, encher de perdizes, total vai quase tudo fora e vamos jantar na tua casa.” O anfitrião concordou e nos deu travessas de saladas, umas vinte perdizes assadas, um engradado de cervejas geladas, mais sobremesas . Saímos à toda para a cidade.Carlos tocou a campainha e exclamou: 
“Amoooorrr, surprêsa, arruma a mesa que já vou servir as perdizinhas, ou tu achou que eu ia fazer bobagem?” 
Veio a jovem esposa toda vermelha de tanto chorar: “meu anjo e eu fui duvidar de ti…”

quarta-feira, 18 de setembro de 2019

DE MÉDICOS E LOUCOS...


É um velho refrão: de médicos e loucos, todos temos um pouco.Salvo porém com coisas muito simples não deveríamos bancar os médicos, baseados por
exemplo no Google. Concordo que essa ferramenta é muito útil para nossa informação. Mas daí a nos auto medicarmos vai um perigo real. Também tenho certeza de que é um erro grave desobedecer às instruções dos profissionais da saúde. Em fevereiro deste ano publiquei uma crônica na qual narrava uma bobagem que cometi, aos 47 anos, após me operar de um esporão do calcâneo. O médico mandou que ficasse de repouso vários dias, com a perna para cima. Não dei muita bola, não sentia dores, saí de muleta  para lá e para cá, deu uma deiscência de sutura, tive que me submeter a debridamento e esperar por longo tempo pela cicatrização por segunda intenção.
Certo dia cheguei à fazenda após uma semana de ausência. Após os relinchos de praxe,perguntei pelo filho de um dos peões. Me disseram que estava de cama. Tinha caído de moto e “lastimado” a perna, mas estaria tudo bem porque um “arrumador” de osso já tinha dado jeito. Entrei no quarto do rapaz. Estava de calção e com uma tala de lascas de taquara envolta numa fita de pano, do meio da coxa até o meio da canela. Claro que se tratava de uma fratura grave. Chamei o pai do guri e disse que ia levar o filho imediatamente ao hospital. “Mas doutor, não “percisa”, o osso vai ficar bom!”. Insisti que não tinha conversa e que ia já chamar a ambulância. E o pai renitente. Fui claro: “então vou chamar agora a Polícia! !” A ambulância veio logo, o rapaz foi internado, é claro que a perna estava fraturada. O moço se salvou. Graças aos médicos do Hospital de Santiago.
Certa madrugada, na estrada, vi uns carros estacionados no acostamento. Tinha havido uma colisão frontal entre dois caminhões. Um dos motoristas dava a impressão de já estar morto. Nisso chegou a Polícia. Ainda deu tempo de eu conseguir subir na cabine do outro caminhão, que estava com o vidro da janela semi aberto e o motorista estava lúcido. A deformação com o choque não permitia abrir nenhuma das portas e ele estava com as pernas presas. Alguns homens arrancaram os cabos da bateria para evitar um incêndio. Os policiais pediram que nos afastássemos, que a ambulância já fora chamada. Subi na boléia do que estava vivo e lhe perguntei como estava. Ele respondeu: “atendam o outro, vejam se está vivo e fiquem frios que estou bem”. Segui meu caminho e de noite o rádio deu a notícia. Os dois motoristas tinham morrido.A falta de um médico...que pena.

quinta-feira, 12 de setembro de 2019

MORO, MOURÃO, GUEDES E BOLSONARO


Com Sérgio Moro eu me preocupava muito. Ele era um juiz singular, ainda não tinha a prática de julgamentos em colegiado. Explico-me: o juiz singular  despacha, instrui o processo e ao término profere a sentença, que tem que ser fundamentada. Isso o juiz vai fazer solitariamente, ele e Deus. Talvez se valha de pesquisas de assessores, mas quem tem a caneta é ele sozinho. No colegiado, Tribunais de Justiça, STJ, STF etc, a regra é que uma turma, um grupo, decide. Isso exige serenidade, acatar quando a maioria decide em contrário a suas convicções. É uma fase para a qual o magistrado tem que estar consciente de que a maioria decide e não ele sozinho.Por vezes se vêem em Tribunais, discussões acirradas, o que não é e nunca foi de meu gosto. Moro, portanto, se já não tinha a experiência de ser contrariado, muito menos tinha a vivência dos meandros  da política.
Por isso  esteve na corda bamba pronto para levar um empurrão e ser defenestrado sem cerimônia. A meu ver - e posso estar errado- o que o salvou foi a opinião pública. Com efeito, quando surgiram as pesquisas dando Moro com alto percentual  de aprovação, ligou-se a sirene do mundo político. Com Bolsonaro em baixa nas pesquisas, só um louco para dar o cartão vermelho a Moro. As ruas seriam tomadas por manifestantes e tudo mais.
Moro maneirou a expressão de suas contrariedades e vai surfando, calmo e fagueiro, na onda de seu prestígio ante as massas.
O General Mourão logo de início não se deu conta de que, conquanto ele fosse general e Bolsonaro capitão, este era Presidente. Mourão quis ajudar, mostrar seu potencial  de , na falta do Presidente, ser o homem certo para continuar no leme do barco. Acontece que isso não pegou bem, começaram as críticas e Mourão fez o certo. Diminui as aparições públicas. 
O nosso ministro Guedes é de pavio curto o que às vezes é bom. É muito preparado para a área, não estava precisando desse cargo para viver, ao contrário, está deixando de ganhar dinheiro. Muitas de suas posições causam certo temor, mas creio que o navio está no rumo certo. Por vezes me pareceu que ia chutar o balde, mas deve ter tido bons conselheiros que o dissuadiram. Posso estar errado mas o caminho para o bem estar de um povo não passa pelo coitadismo, por medidas populistas e por óbices à livre iniciativa.
No que tange ao Presidente, vamos ter que rezar para que seus excessos verbais não causem uma situação de irreversibilidade, se é que me entendem. 
Bolsonaro saiu das praias do Rio, mas a espontaneidade da maioria dos cariocas não saiu dele

quinta-feira, 5 de setembro de 2019

A BELA AMPARO


Hoje, sem nenhum preconceito, vou contar um episódio de que tomei conhecimento há muitos anos.  É sobre um costume, que creio hoje desaparecido, que alguns homens da campanha tinham: “ter uma  protegida”. É um caso de amor “brujo” e enfumaçado, amalgamado com paixões carnais inconfessáveis.
Os fatos se deram também na região  da campanha gaúcha. A vida fluía sem muitas novidades .Vou descrever o que vi e ouvi, mas “por la leche de mi madre” juro que eu nunca fui dessas práticas, muito menos frequentar a “ zona”, pois minha mãe Ludmila,  me advertia severamente a não  frequentar esses lupanares, brandindo seu dedo em riste e me alertando  para as sífilis, gonorréias e outras coisas que poderiam me acontecer. 
Nessa cidade a que me refiro, havia um, como se diz hoje, operador do direito, que era meio feio, mas possuía muita “plata”. Tinha família constituída, ia com esposa e filhos para a santa missa, mas era um predador voraz das delícias do amor clandestino. 
O ínclito dr. Hermenegildo , chamemo-lo assim,  era respeitado e até admirado. Mas tinha um “fraco” por jovens mulheres. É que, segundo “pérfidos” costumes da época, era tolerada a “proteção” a uma mocinha, desde que isso não implicasse desrespeitar publicamente a esposa “legítima”. Até se ouvia: “ normal, coisa de homem”.
O dr. Hermenegildo, no entanto, tinha um mau costume para os preceitos consuetudinários da época. Não se contentava só nos meneios e práticas, mas se apaixonava. Alugava uma casinha, montava um instituto de beleza, como era usual. Todavia, depois de certo tempo, se “desapaixonava” e resolvia as coisas em perdas e danos.
Certo dia desembarcou, vinda de Rivera, uma morocha de fechar o trânsito. Aparecia nos cafés e restaurantes, vendendo “alfajores” que ela mesma fazia na casa de uma tia que morava lá perto dos trilhos. Arrastava olhares lascivos. Amparo era seu nome. Linda como laranja de amostra.
O dr. Hermenegildo a viu passando pela rua principal e a abordou. A moça não lhe deu atenção, fez um muxoxo e seguiu com o balaio de doces. Tipo da guria para constituir família.  Hermenegildo não se sofreu e concluiu que ia fazer uma proposta para Amparo. Dar-lhe-ia uma casa, mais uma quadra de campo e celebraria com ela um “contrato de bom viver”, quem sabe ter um filho .
Decidiu relatar sua decisão a um compadre. O amigo lhe disse que parasse com isso, que lhe indicaria uma moça cancheira,  recém  chegada na zona e  louca de querendona, como ele mesmo constatara.
Qual é o nome dela, perguntou Hermenegildo?
Amparo, retrucou o amigo.