TITO GUARNIERE
CENSURA E CURTO-CIRCUITO
O Ministério Público do
Trabalho enviou à TV Globo uma “notificação recomendatória” - com 14
recomendações - porque no entender da procuradoria a diversidade racial está
sub-representada na novela Segundo Sol. A trama se passa na Bahia e há uma
prevalência de atores brancos no elenco.
Não há razão de se contrapor
à uma ação do Estado para combater o preconceito de raça, classe ou orientação
sexual. Mas o Ministério Público, quando notifica uma emissora porque não
gostou da proporção da cor entre atores e atrizes de uma novela, adentra,
impávido, pelo terreno da exorbitância.
Nesse tom, o MP irá escalar
atores, reescrever diálogos, mudar o roteiro. Que tal cotas raciais para atores
de novelas? Em uma só palavra, trata-se de censura, que é proibida pela Constituição.
E quem promove a violação? O Ministério Público, órgão que tem como dever a
defesa da ordem jurídica.
Está bem que se trata do
Ministério Público do Trabalho, uma espécie de comissariado em permanente
estado de beligerância contra a classe patronal. Terá o MPT cogitado de
calcular a proporção existente entre procuradores brancos, pardos e negros na
sua própria casa de trabalho? Como é provável que a maioria dos procuradores é
da cor branca, deve-se perguntar, com todo o respeito, se o MPT enviou alguma
notificação recomendatória a quem de direito, para que a devida proporção seja
respeitada.
De todo modo, a Rede Globo
não tem muito do que reclamar, depois do que fez com o jornalista William
Waack. Provou do seu próprio veneno.
Em outro front, o Supremo
Tribunal Federal restringiu o foro privilegiado dos senadores e deputados
federais. Muito bem. Para a opinião pública, o foro especial tinha se tornado
um privilégio, através do qual políticos acusados de delitos, principalmente de
corrupção, escapavam impunes.
Foi como uma escolha a dedo,
atingindo apenas cerca de 600 membros do
Congresso Nacional. Permanecem com as mesmas vantagens do foro especial mais de
50 mil autoridades, entre as quais todos os juízes e procuradores do Ministério
Público, vale dizer, os próprios ministros do STF.
A decisão do STF obriga a
uma revisão de todos os casos da prerrogativa. No Superior Tribunal de Justiça,
que é o foro especial de governadores, membros de tribunais e do Ministério
Público Federal, no caso de delitos comuns e de respondabilidade, já se discute
abertamernte a necessidade de uma compatibilização. Compatibilizar significa,
por exemplo, que juízes de primeira instância poderão julgar desembargadores.
Mas logo no início da
previsível polêmica, o mesmo Ministério Público Federal, tão fervoroso em
defender o fim do foro especial de senadores e deputados, não quer entretanto
alterar o privilégio de foro deles mesmos, como se manifestou Luciano Mariz
Maia, da Procuradoria Geral da República. Como sabemos, pimenta nos olhos dos
outros é colírio.
Toda essa balbúrdia tem
origem na escalada legisladora do Poder Judiciário, principalmente no STF. Os
ministros da Corte Suprema, com certas decisões, pensam que estão arrumando a
casa, mas acabam provocando um curto-circuito no sistema.