terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

NOVA DIREÇÃO, VELHOS VÍCIOS - TITO GUARNIERE

 TITO GUARNIERE   

 NOVA DIREÇÃO, VELHOS VÍCIOS  

O Palácio do Planalto está eufórico com a vitória dos seus aliados para as presidências do Senado Federal, Rodrigo Pacheco, e da Câmara dos Deputados, Arthur Lira. Mas o presidente da República Jair Bolsonaro e os seus arautos deveriam conter o entusiasmo - é vitória à qual falta substância, matéria altamente perecível, no ambiente flácido, volátil dos senhores deputados e senadores.   

Logo ao primeiro embate real, à primeira votação importante de interesse do Planalto, novas faturas serão apresentadas no guichê do Tesouro - onde falta dinheiro para tudo, menos para assegurar o apoio da maioria nas casas do Congresso, principalmente na Câmara dos Deputados. As verbas e cargos agora concedidos só quitam os votos dados a Pacheco e Lira. Finalizado este episódio, a cada nova votação será necessário combinar novos, por assim dizer, emolumentos.   

Aquela massa disforme que chama de Centrão é insaciável. Bolsonaro mergulhou fundo na bacia das almas para eleger os seus preferidos. Não tem volta: daqui para frente ou ele paga a conta cada vez que precisar, ou receberá em troca retaliações e derrotas no Parlamento.   

Se ao menos a troca de favores entre Executivo e Legislativo tivesse em vista um plano, uma votação decisiva, uma lei estruturante, impopular mas necessária, objeto de disputa entre interesses conflitantes (como é o caso das reformas administrativa e tributária), então haveria uma justificativa. Mas da forma como se deu, e como se dará daqui para frente, não obedece a nenhum critério de interesse público. Há um obstáculo intransponível: o governo Bolsonaro tem uma noção vaga, confusa e contraditória do que quer, governa aos espasmos, não tem plano, não tem projeto.   

Com Lira e Pacheco o Brasil continuará o mesmo, andando de lado e em marcha lenta. O Congresso Nacional seguirá sendo o palco de questões paroquiais, cada parlamentar disputando a tapas o seu quinhão de verbas públicas e de fatias orçamentárias - é o que vale e conta para a reeleição em 2022. Como Bolsonaro, eles, os parlamentares, só pensam naquilo.  

A representação parlamentar vem perdendo qualidade a cada legislatura - é uma constatação quase unânime. O Congresso Nacional é um gigante disfuncional e o resultado previsível das suas notórias distorções. A representação é torta - no estado de São Paulo cada deputado federal representa 650 eleitores; em Roraima, 72.   

Não há Parlamento que funcione com tantos partidos políticos. Não existe no mundo nada parecido com a cornucópia de agremiações políticas, que nascem da legislação frouxa combinada com a fartura das verbas do fundo partidário. Não são agremiações políticas, mas balcões de negócios.  

Não existe a menor chance desse Congresso - e dos seguintes - de ao menos aprovar o voto distrital, a mais elementar forma de baratear o custo de campanha e de aproximar o eleitor do seu representante.  

Enfim, as casas do Congresso não correm o menor perigo de melhorar.  Ainda no século passado, quando um interlocutor criticou o baixo nível do Parlamento, o doutor Ulisses Guimarães vaticinou: "Se você acha ruim essa legislatura, espere a próxima".    

titoguarniere@outlook.com