O internato do colégio
Anchieta em Porto Alegre, na rua Duque de Caxias, onde hoje tem uma garagem
inacabada, ao lado do Museu Júlio de Castilhos, era dos padres Jesuitas, a
grande maioria alemães. Ja falei e contei minha história que me marcou na
paleta para o resto da vida, como ferro quente, no quarto do animal. Eu vim com
doze anos para o Colégio Anchieta, cursar o admissão ao ginásio, em 1950,
depois de 1951 a 1954, os quatro anos do Ginásio e depois, de 1955 a 1957, o
Curso Clássico, com sete aulas de Latim por semana, pois, o Clássico preparava
para o vestibular de Ciências Humanas e o Curso Científico preparava para
Ciências Exatas. Era uma divisão saudável, pois, cada faculdade fazia seu
vestibular, escrito e oral. Nada desta trágica invenação brasileira, pois,
segndo me dizem pessoas que viajam e conhecem e estudam a matéria, um dos
újnicos países do mundo a ter este monstrengo do vestibular unificado - onde se
concentram e explodem todas as angústias da juventude - para entrar numa UFRGS
da vida - etc..etc..sem respeitar o pendor natural e o talento inato que cada
jovem leva consigo desde o berço. Ora exigir me exigir vestibular de Quimica,
Física, Matemática, História Natural. Era um horror. Um drama. Uma angústia. Um
tráuma. Eu queria ser advogado desde criança. No Curso Clássico com os ótimos
professores jesuitas, todos com formação de teologia e de filosofia, na
Europa, ( tres anos cada uma) nos ensinaram o gosto pela leitura, pela
poesia e assim lemos os livros clássicos, da Idade Média, do Renascimento,
do Romantismo, do Realismo, do Parnasianismo, do Simbolismo e da Semana da Arte
Moderna de S. Paulo, de 1922, revolução na cultura brasileira tendo Mario de
Andrade à frente e assim penetramos no grande mundo do Modernismo. Havia padres
que não gostavam do Modernismo, pois, liberou o pensamento filosófico, saindo
da Filosofia Escolàstica Católica, principalmente, do Index, a relação do
Vaticano que proibia a leitura de certos livros. Diziam os padres velhos que o
Modernismo tinha aberto a porta para o comunismo e isto seria a desgraça do
Brasil. Tinham horror ao comunismo e à Revolução de outubro de 1917, que
implantou o socialismo comunista na Rússia. Podaimos ler os autores anteriores,
Tolstoi, Máximo Gorki, Gogol, Dostowesky, e outros clássicos russos que não
lembro o nome agora. Os padres jesuitas com sua disciplina férrea e exigente,
souberam infundir na minha turma de 1950, o gosto pela leitura, pelo arquivo
das frases selecionadas, em cadernetas, para guardar e lembrar e inclusive a
decorar poesia, principalmente dos franceses, como Lamartine, Alfred de Musset
( o menino terrível - l'enfant terrible), Paul Vigni, e tantos outros.
Descendo para o nosso pequeno
mundo de P. Alegre, nem pensar em ler as obras de Erico Veríssimo, de Dionélio
Machado, e outros pois tinham brigado com o pe. Reitor do Anchieta - devido ao
desentendimento havido por uma publicação na Revista - O
Eco - católica e distribuida gratuitamente para os alunos
- na qual o padre Reitor do Anchieta, Jesuita alemão, escrevera
criticando a Livraria do Globo que estava a publicar e traduzir os modernistas,
espanhóis, thecos, alemães, e sobretudo os franceses do existencialismo, como
Jean Paul Sartre a que os padres diziam que o aluno que lesse este livros
cometia pecado mortal e iria para o inferno. E no dito artigo do padre reitor
anchietano entrou a falar sobre o filho do Dr. Getúlio Vargas, que fora aluno
do Anchieta e já em S. Paulo, morreu muito jovem, e levava o nome de
Getulio Vargas Filho, conhecido como "Getulinho".
Esta divergência entre o
padre Reitor do Anchieta e o Erico Veríssimo dividiu a intelectualidade gaúcha
da época. De um lado os comunistas, com baixo assinado de todos, de milhares a
favor de Erico Verissimo, os comunistas. De outro lado, os católicos, a favor
do padre Reitor, começando com Armando Câmara, Adroaldo Mesquita da Costa, Ruy
Cirne Lima, Galeno Lacerda, Elpidio Ferreira Paes, Carlos de Brito Velho e
outros. Correu o processo criminal, por ação penal privativa do
ofendido, no qual Erico processou o padre reitor anchietano, por calúnia,
difamação e injúria - na 5° Vara Criminal de Porto Alegre - processo que foi
queimado no fogo gigantesco que foi o incêndio do Tribunal de Justiça, em 19 de
novembro de 1949, mas cujo tema foi recuperado pelo filósofo jovem, Enrique
Casses Trindade, culto e preparado e que era filho do famoso tabelião
Trindade, na Travessa Leonardo Trudda, , Dr. Otto Bélgio Trindade e que residia
no palacete ainda existente, na esquina da Av. Venâncio Aires com a rua Santa Terezinha,
hoje fechado, e onde funcionou por algum tempo, o museu e curso de artes
plásticas no Torreão.
Era o tempo da famosa
LEC - Liga Eleitoral Católica, - na qual o Arcebispo, Dom Vicente
Scherer, listava os candidatos católicos que podiam ser votados pelos
católicos, dos partidos politicos e ao mesmo tempo apontava os candidatos
políticos dos partido e que os católicos não podiam votar em ditos
canditatos pois eram comunistas. O comunismo era um pavor. Criava
verdadeiro frenesi de tremores e críticas e raivas dos membros fanáticos
da extremada LEC.
Pois bem, eu fui interno no
Colégio Anchieta, de 1950 a 1953, eis que neste ano os padres resolveram fechar
o internato e aí eu fui morar em pensão com meu irmão mais velho Nicanor, que
estudava medicina na UFRGS e também fora aluno do Anchieta.
Levantar às seis da manhã,
estudar meia hora, reler a matéria do dia da aula, e depois a missa na fina
capela equena, na entrada do colégio à direita, celebrada elo padre Reitor. Eu
fui coroinha. Fiz o curso e me tornei coroinha.. Depois ir tomar café no
refeitório, onde era proibido falar, e um colega lia o trecho da Biblia.
Depois, voltava para o internato, tinha uns quinze minutos para se
preparar e ir para a aula. Havia os pequenos, chamados "pregos"
minha categoria, com seu dormitório; os médios, com seu dormitório e os
grandes, que moravam em quartos, de cinco colegas. Os "grandes" eram
todos alunos do Curso Clássico ou Científico. Depois o almoço, no
refeitório,não podia falar Após almoço tinha recreio até às 14,0 hs,
quando uns jogavam futebol, outros basquete e volei e outros liam pelo pátio ou
jogavam ping pong ou xadrez na sala de jogos, no porão. Estudo das duas às
quatro. Café da tarde, recreio com jogo de futebol. Estudo, das cinco às sete.
Janta, no refeitório, leitura, em silêncio. Voltava para o internato, ficava
meia hora na gande sala de estudos, onde cada um tinha sua mesa de
estudos individual ( púlpito) com a parte de cima que servia de tampa e
que levantava e tinha a grande gaveta e onde se guardavam livros e cadernos. As
vinte e uma horas, todo mundona cama e era apagada a luz e deu. A rotina
do internato. Rigorosa. Todos os dias a mesma coisa. Só tinha banho frio, no
porão onde tinha os banheiros.
Era uma pedagogia rigorosa
que não tirou o couro de ninguém.
Como coroinha tinha a
mordomia de sair do internato para ajudar missa com os padres jesuitas que
rezavam missa nas igrejas, capelas, hospitais, creches, na Casa de Correção
como pe. Pio Book, e depois sempre tinha um café com mistura, maravilhoso e eu
ganhava das freiras, um pacote de bolachas, biscoitos, pães, etc.. que levava
para o internato e escondia.
A comida era ruim, feita
pelos " Fritz" - jovens alemães recrutados na colônia alemã,
que não pssariam de " Fritz" e faziam todos o serviço domético, desde
a comida, varrer as salas de aula e cuidar de tudo, roupas dos padres,
etc..etc.
Havia os irmãos que eram
chefe de marcenaria, oficinas e tudo mais, pintar, arrumar e consertar janelas,
portas, camas, bancos, cuidar das capelas, a grande do externos e a pequena dos
internos. Os "fraters" podiam seguir a carreira religiosa
e entrar no famoso Seminario do Cristo Rei, em São Leopoldo, que tem aquela
estátua do Cristo com os braços abertos sobre o clássico prédio, berço e onde
inciou a UNISINOS. Antes era tudo campo e criação. Hoje e uma cidade, que vai
da BR-116 até o outro lado na Estrada Velha de cimento de P. Alegre a S.
Leopoldo, e onde tem o Santuário do Pe. Réus, o cemitério dos jesuitas, a
Igreja do Santuario do Pe. João Baptista Réus e que passava no meio do
famoso Horto Florestal..
Muitos entraram, jovens,
ainda, no Noviciado de Pareci Novo, cujo enorme prédio está abandonado, quanto
ouví dizer .
Tudo isso e muito mais, me
despertaram a recordação saudosa dos meus colegas de aula e de internato,
diante do texto do amigo Ry Armando Gessinger sobre o Colégio Santo Ignacio.
A foto do grande colégio é
grandiosa. Infelizmente, não me lembro mais onde ficava o colégio Santo
Ignácio. Santo Ignacio de Loyolla, nos idos de 1.500, fundou a Ordem dos
Jesuitas, e criou a Contra-Reforma para combater a Reforma de Martin Lutero e
que cria o luteranismo com as famosas máximas que pregou na porta de sua Igreja,
em 31' de outubro de 1551.
Nério "dos
Mondadori" Letti.