terça-feira, 3 de dezembro de 2019

170 ANOS DE CULTURA ALEMÃ EM SANTA CRUZ DO SUL


170 anos, homenagem à cultura.Dra. Lissi Bender – integrante da comissão 170 anos.
Celebrar 170 anos da Imigração Alemã é também celebrar a fundação de Santa Cruz. Santa Cruz foi a primeira colônia totalmente planejada e executada pelo governo da então Província de São Pedro do Rio Grande do Sul. O governo de nosso Estado convidou, por meio de seus emissários, famílias de língua alemã, de regiões germânicas a se estabelecerem na recém fundadaKolonie Santa Cruz.
A Universidade de Santa Cruz do Sul se uniu às celebrações que ensejam honrar e festejar este começo.  Com músicas e cantos da cultura germânica, a orquestra e o coro da UNISC promoveram um concerto que tocou fundo a alma dos participantes, e deixou a alma dos descendentes dos imigrantes em júbilo. Foi uma noite cultural ímpar, para celebrar a cultura germânica em um de seus aspectos mais sensíveis, a música, o canto, a cultura. Deveras, as famílias de imigrantes vieram de um mundo cultural marcado pela reforma da Igreja, pelo mundo das ideias de Martim Luther. Luther defendia queler fomenta a inteligência; que o povo precisa ler, precisa aprender a pensar para ser livre e não poder ser ludibriado; que a Bíblia precisa ser lida e compreendida por todos e, para isso, a traduziu para o alemão. Sua impressão foi possível graças a invenção da imprensa por Gutenberg.E não é à toa que hoje a Alemanha sedia a maior feira mundial do livro.
A defesa de Martin Luther também permeou os ideais do Iluminismo, incentivando as pessoas a fazerem uso de sua própria capacidade racional; o grande filósofo alemão Kant as encorajava: Habe Mut, dich deines eigenen Verstandes zu bedienen, ou seja, tenha coragem de fazer uso de seu próprio entendimento. No início de 1800, já se havia tornado muito popular uma canção que lembrava ao povo que os pensamentos são livres:  Die Gedanken sind frei.
Os imigrantes vieram de um mundo que valorizava o canto, o livro, a leitura. Na Prússia a frequência à escola já era obrigatóriadesde 1752; de um mundo em que já existiam universidades, antes mesmo de o Brasil ser descoberto (fiz meu doutorado em uma dessas universidades seculares); vieram de um mundo em que floresciam pensadores e poetas. Em que poesias, como as de Goethe, Heine, Fallersleben, Eichendorf eram transformadas em canções populares.
O advento da imprensa, incentivou os poetas Clemens Brentano e Achim von Armin a coletar canções da tradição oral alemã, desde a Idade Média até o início de 1800 e a publicá-los em três volumes, em 1805 e 1808, sob o título Des Knaben Wunderhorn, em tradução literal: A corneta mágica do menino. Nestes três livros registraram inúmeros cantos que acompanhavam as pessoas em suas caminhadas, cantos voltados para a natureza em sua profusão e transformação ao longo do ano, cantos infantis, cantos de amor, de despedida, de reencontro e muitos mais.
Deveras, o cantoe a música compõem um dos muitos bens culturais que acompanhou os imigrantes a Santa Cruz. O canto esteve e está presente na vida das pessoas desde o berço até a morte. Canto para a criança adormecer, para acompanhar a família nas lides do dia a dia, seja em casa, na roça, na igreja, na comunidade, no enterro. Na minha infância o canto participava de todos esses momentos. E continuamos cantando, por que sem o canto, sem a música, a vida seria um engano, nos lembra Nietzsche: “ Ohne Musik wäre das Leben ein Irrtum”.

BELA CRÔNICA DE FRANKLIN CUNHA

Legalidade, legitimidade e  a Economia

A tese de Giorgio Agamben, filósofo italiano, marxista e católico, é fundamental para entendermos nossa situação política e econômica atual. Diz ele que a distinção feita entre dois princípios essenciais da tradição ético-política ocidental, a legitimidade e a legalidade, parece ter sido esquecida e perdido toda a consciência delas por nossas  sociedades modernas.
Os poderes e as instituições, afirma Agambem, não se encontram deslegitimadas porque caíram na ilegalidade, mas pelo contrário, a ilegalidade está tão difundida e generalizada porque os poderosos perderam toda a consciência de sua legitimidade. Porém não devemos pensar que poderemos enfrentar as crises de nossa sociedade apenas  pela ação – evidentemente necessária – do poder judicial. Uma crise que golpeia a legitimidade não pode ser resolvida no plano do direito institucionalmente estabelecido. A sua  hipertrofia  acaba de desembocar, por meio de um excesso de legalidade, na perda de toda a legitimidade essencial.
As tentativas insuficientes da Modernidade de fazer coincidir  legalidade e legitimidade, procurando assegurar a legitimidade de um poder pelo tradicional direito positivo, que nos rege, acusa, julga e condena, deu como resultado o incontornável processo  de decadência no qual entraram parte de nossas instituições democráticas.
E é nessa conjuntura, em momentos de instabilidade política, econômica e social (e jurídica), que os economistas – confundido e manejando canhestramente  os conceitos de legalidade e legitimidade - assumem os destinos da nação. E assim as políticas econômicas têm sido sequestradas por grupos de tecnocratas que se encastelam em supostas leis imutáveis das relações comerciais. Esses grupos situados politicamente na extrema direita do neoliberalismo, habitualmente estão ligados a interesses escusos e adotam a crença de que os fins justificam os meios.
Assim- afirma Jacques Sapir (“ Economistas Contra a Democracia”) – “vivemos numa espécie de conjuntura  destinada a lesar gravemente  a democracia, já que esses grupos atuam por sua conta e risco à margem de um controle maior, usurpando espaços políticos com o argumento que são “ experts “em  economia.  Pior: são (de)formados por escolas e teorias econômicas que produzem “especialistas“, limitados em sua formação e interpretações da realidade e que se baseiam  somente em dados  econômicos, ignorando  as amplas  realidades social, cultural e ontológica dos povos nos quais  são aplicadas suas teorias.
Afinal, que tipo de “experts“ são esses, pergunta Sapir? Os mesmos que conduziram países inteiros, ( os exemplos são atuais, reais e evidentes), à corrupção e à pobreza?”
Com muita frequência ser especialista em economia, implica em ignorar a história, a política, a música, a poesia e enfim as grandes artes que derrotaram a barbárie e civilizaram a humanidade.
A especialização resulta em se perder de vista o esforço árduo de construir arte, a “sabedoria e a sapiência”, estas  bem definidas por Roland Barthes. Enfim, como economista muito especializado, o indivíduo domestica-se e aceita tudo o que poderosos do momento lhe disserem  e permitirem.  Em última análise, limitar-se à especialização é acomodar-se ao estamento presente e assim fazer o que os outros mandam, porque essa é, afinal, a especialização que lhes permitiram exercer. 
Pois, lendo o livro de Paulo Timm, “ Devires e Derivas“percebo eu ele não é um desses especialistas.
Economista, formados pela UFRGS, graduado na Escola Latina da Universidade do Chile, na CEPAL/BNDES e Técnico do IPEA, PauloTimm é dotado de uma ampla formação cultural que inclui não somente economia, como literatura, história, sociologia, psicologia, a música popular  e... a poesia.
São esses variados, úteis  e amplos conhecimentos é que lhe permitem e possibilitam interpretar a realidade dramática ( mesmo trágica) de um país rico, tão variado e  poderoso em nobres qualidades humanas como o nosso, o qual exclui de uma vida digna de seres  humanos milhões de nossos irmãos e irmãs brasileiros.
Enfim, assinalo que Paulo age, crê  e sonha poeticamente, pois  gostou e se emocionou quando lhe reproduzi a opinião profética de Antonio Machado quando este diz que “ La Poesia es una arma cargada de futuro “.

Franklin Cunha
Aeronauta
Médico
Membro da Academia Rio-Grandense de Letras