Observando o império das crianças sobre seus pais e avós e a “juvenilização” brasileira, meus pensamentos não param de voltar ao século passado. Não sei se meus pais e avós agiram certo, se seria correto agir assim hoje, mas eu não os trocaria por nada deste mundo.
A família de meus avós Rudolf e Rosália era numerosa. Os dois exerciam forte poder sobre os filhos, até sobre meu pai, que já era casado.
As relações eram respeitosas. À mesa meu avô servia-se em primeiro lugar, depois a avó e depois os filhos e netos, por ordem crescente de idade. Isso mesmo, as crianças vinham primeiro. Rezava-se antes de iniciarem as refeições.Quando se iniciava uma pequena discussão entre meus tios ou tias, o simples olhar do meu avô os silenciava. Nunca vi meu avô gritar ou ter um gesto violento.
Meus pais me ensinaram o gosto pelo comércio, pelo lucro lícito, pelo trabalho e por ser pontual nas contas. A estrutura familiar antigamente impunha limites que a gente não se atrevia a ultrapassar, mesmo depois de adulto. No tempo em que eu fumava, jamais me atrevi a o fazer na frente de meu pai.
Mas sempre chamei meus avós e meus pais por tu, nunca por senhor.
Eu sei, eu sei, eu tentei fazer o mesmo com meus filhos e agora os vejo também meio “ autoritários” em suas famílias.
Comprazo-me com isso.
Um dia escandalizei um amigo. É que descobri, na casa de meus pais, uns guardados, fotos antigas e os boletins escolares.O amigo, ao os examinar, exclamou:” Bah amigo , andaste fazendo cola quando piá.”
Vejam só: havia matérias como Desenho, Trabalhos Manuais, e eu só tirava 3 ou 4 na nota.
Em compensação, eu era bom em idiomas estrangeiros, filosofia, e assuntos do gênero.
A gente tinha uma espécie de caderneta escolar, onde eram registradas as notas. Inicialmente, temendo a tristeza do meu pai, esmerei-me em falsificar sua assinatura, o que se podia ver a olho nu.
Depois evoluí para a terceirização: encomendava os trabalhos manuais, com a serra tico-tico e outras bobagens. Entregava o desenho para coleguinhas mais aptos, em troca de lhes fazer trabalhos abstratos.
Assim ia passando de ano e as notas melhoraram.
Meu amigo estranhou quando lhe mostrei os vestígios de meus deslizes já prescritos.
Mas será que eu já era um " espertinho" ou só queria sobreviver?
Tarde demais para saber.
Será que vai ruir todo o meu conceito?
Só sei que me divirto até agora ao ver a cara de espanto do meu amigo que, na crença da ética, talvez me conceda o benefício do “estado de necessidade”.
( Como está tudo agora ?
Melhorou?)