terça-feira, 3 de dezembro de 2019

BELA CRÔNICA DE FRANKLIN CUNHA

Legalidade, legitimidade e  a Economia

A tese de Giorgio Agamben, filósofo italiano, marxista e católico, é fundamental para entendermos nossa situação política e econômica atual. Diz ele que a distinção feita entre dois princípios essenciais da tradição ético-política ocidental, a legitimidade e a legalidade, parece ter sido esquecida e perdido toda a consciência delas por nossas  sociedades modernas.
Os poderes e as instituições, afirma Agambem, não se encontram deslegitimadas porque caíram na ilegalidade, mas pelo contrário, a ilegalidade está tão difundida e generalizada porque os poderosos perderam toda a consciência de sua legitimidade. Porém não devemos pensar que poderemos enfrentar as crises de nossa sociedade apenas  pela ação – evidentemente necessária – do poder judicial. Uma crise que golpeia a legitimidade não pode ser resolvida no plano do direito institucionalmente estabelecido. A sua  hipertrofia  acaba de desembocar, por meio de um excesso de legalidade, na perda de toda a legitimidade essencial.
As tentativas insuficientes da Modernidade de fazer coincidir  legalidade e legitimidade, procurando assegurar a legitimidade de um poder pelo tradicional direito positivo, que nos rege, acusa, julga e condena, deu como resultado o incontornável processo  de decadência no qual entraram parte de nossas instituições democráticas.
E é nessa conjuntura, em momentos de instabilidade política, econômica e social (e jurídica), que os economistas – confundido e manejando canhestramente  os conceitos de legalidade e legitimidade - assumem os destinos da nação. E assim as políticas econômicas têm sido sequestradas por grupos de tecnocratas que se encastelam em supostas leis imutáveis das relações comerciais. Esses grupos situados politicamente na extrema direita do neoliberalismo, habitualmente estão ligados a interesses escusos e adotam a crença de que os fins justificam os meios.
Assim- afirma Jacques Sapir (“ Economistas Contra a Democracia”) – “vivemos numa espécie de conjuntura  destinada a lesar gravemente  a democracia, já que esses grupos atuam por sua conta e risco à margem de um controle maior, usurpando espaços políticos com o argumento que são “ experts “em  economia.  Pior: são (de)formados por escolas e teorias econômicas que produzem “especialistas“, limitados em sua formação e interpretações da realidade e que se baseiam  somente em dados  econômicos, ignorando  as amplas  realidades social, cultural e ontológica dos povos nos quais  são aplicadas suas teorias.
Afinal, que tipo de “experts“ são esses, pergunta Sapir? Os mesmos que conduziram países inteiros, ( os exemplos são atuais, reais e evidentes), à corrupção e à pobreza?”
Com muita frequência ser especialista em economia, implica em ignorar a história, a política, a música, a poesia e enfim as grandes artes que derrotaram a barbárie e civilizaram a humanidade.
A especialização resulta em se perder de vista o esforço árduo de construir arte, a “sabedoria e a sapiência”, estas  bem definidas por Roland Barthes. Enfim, como economista muito especializado, o indivíduo domestica-se e aceita tudo o que poderosos do momento lhe disserem  e permitirem.  Em última análise, limitar-se à especialização é acomodar-se ao estamento presente e assim fazer o que os outros mandam, porque essa é, afinal, a especialização que lhes permitiram exercer. 
Pois, lendo o livro de Paulo Timm, “ Devires e Derivas“percebo eu ele não é um desses especialistas.
Economista, formados pela UFRGS, graduado na Escola Latina da Universidade do Chile, na CEPAL/BNDES e Técnico do IPEA, PauloTimm é dotado de uma ampla formação cultural que inclui não somente economia, como literatura, história, sociologia, psicologia, a música popular  e... a poesia.
São esses variados, úteis  e amplos conhecimentos é que lhe permitem e possibilitam interpretar a realidade dramática ( mesmo trágica) de um país rico, tão variado e  poderoso em nobres qualidades humanas como o nosso, o qual exclui de uma vida digna de seres  humanos milhões de nossos irmãos e irmãs brasileiros.
Enfim, assinalo que Paulo age, crê  e sonha poeticamente, pois  gostou e se emocionou quando lhe reproduzi a opinião profética de Antonio Machado quando este diz que “ La Poesia es una arma cargada de futuro “.

Franklin Cunha
Aeronauta
Médico
Membro da Academia Rio-Grandense de Letras