TITO GUARNIERE
PRODUTORES RURAIS
Sou do interior mas nunca tive de pegar no
pesado de lavrar a terra, plantar, colher. Então, por proximidade, pela
identidade de tios e primos agricultores, conhecendo a lida (um pouco à
distância) e partilhando as suas aflições, sempre vi o homem do campo com
admiração e respeito.
Com o tempo fui descobrindo que o criador, o
agricultor, os brasileiros que garantem a produção dos alimentos, entretanto,
não eram merecedores da mesma consideração, da parte de amplos setores da
sociedade. Ao contrário.
Para muita gente boa, agricultores, produtores
rurais são conservadores, privilegiados e exploradores. É a teoria dominante na
academia, na mídia, nas esquerdas. Para estas, conta somente a chamada
"agricultura familiar", e a produção dos assentamentos da reforma
agrária, que certamente têm relevância, mas que, se dependêssemos delas, o
Brasil estaria no mapa da fome. A agricultura familiar, os assentamentos são
basicamente de subsistência. De um ponto de vista macro, em um país da extensão
e da população do Brasil, os excedentes que eles produzem são insignificantes.
Conservadores? Muita gente não gosta deles, mas
conservador é ofensa só em certas áreas impregnadas de ideologismo. O
conservadorismo é uma forma legítima de ver o mundo e não um defeito. É
provável que os produtores rurais, em maioria, sejam conservadores, porque eles
têm de viver às suas próprias expensas, unicamente à custa do seu trabalho. E
com muito trabalho, de ano a ano, dependem de outros fatores que eles não
dominam: o tempo, o clima, o transporte da produção, os preços no mercado, as
taxas de juros, as conjunturas nacionais e mundiais. Como falar de privilégios
com todos esses fatores a intervir na produção, nos seus ganhos e rendimentos,
na sua situação de vida?
Exploradores? Costuma-se ligar a eles, os
produtores rurais e ao campo, o trabalho escravo, a situação análoga à escravidão.
Existem, sim, casos da espécie. Mas as estatísticas comprovam que são
residuais, constituem exceções em um universo de milhões de trabalhadores.
E atenção: um produtor rural que contratar um
trabalhador, além das obrigações trabalhistas comuns, está sujeito a 252
exigências legais específicas, na agricultura, pecuária, silvicultura,
exploração florestal e aquicultura. Quem vocês acham que é vítima, numa
situação em que uma das partes tem 252 obrigações a cumprir ?
É provável que existam produtores rurais
caloteiros, predadores ambientais, maus patrões. Tanto quanto em todas as
demais categorias. É puro preconceito acusá-los todos, generalizar tal juízo de
valor. Não há categorias de trabalhadores ou de produtores moralmente
superiores às outras.
Os jornalistas da grande imprensa, quando falam
dos produtores rurais, só falta dizer que eles vivem dos favores concedidos à
"bancada rural". Mas nenhum desses jornalistas faz mais pelo Brasil
do que eles, os produtores rurais. Cada vez que nos servimos de um bom prato de
arroz e feijão, que tanto apreciamos, deveríamos lembrar deles com gratidão.
Poucos, como o homem do campo, trabalham tanto, vivem tantas aflições e
precisam vencer tantas dificuldades para viver com dignidade.