terça-feira, 22 de janeiro de 2013

AINDA SOBRE OS BICHOS NAS CIDADES...


Natureza - entre abundância e avidez  – Lissi Bender – lissi@unisc.br

Estou em meu Arbeitszimmer, que ouso chamar de biblioteca, centrada em meu projeto Memória Viva, quando os fios do meu pensamento são interrompidos por um insistente tucano. Levanto meu olhar em direção ao verde abundante que se descortina diante de minha janela e vejo um solitário filhote no alto do angico. Volto para minha atividade, mergulho em sensíveis poesias brotadas da alma de Irma Lau: “Ich möchte alles andere sein, nur nicht ich selber! Im tiefsten Meeresgrund, ein Stein, am fernen Himmelszelt, ein Stern…“  as palavras me  transportam  para …. Oh Gott!,  sou trazida outra vez à realidade, agora por um coro de tucanos . Volvo meu olhar novamente para o  angico e vejo cinco, não, seis tucanos.

Há muito percebo, em minha wilde Heimat que fica nos fundilhos da Alte Pikade,  um se achegar maior de aves silvestres.  Estariam estas vidas  sendo coagidas a migrar pelos acelerados desmatamentos  promovidos pelo homem usurpador que se impõe sobre todas as demais vidas? Que em sua voracidade  apodera-se sem  dó nem piedade de espaços vitais  para inúmeras vidas silvestres, vitais para a diversidade biológica no planeta e a vida humana. Entre os viventes que por aqui se refugiam e  buscam sustento tenho saudado Waldtauben (Pombas do mato), Pfeffervögel (Tucanos), Eulen (Corujas),  Wasserhühner (Saracuras) Jacús, ...  . Também Stachelschweine (porco-espinho) hospedam-se por aqui durante o verão. Todos são bem-vindos a compartilhar a mesa da ceia do Senhor, mas sou tomada de um sentimento de desalento quando penso nos motivos que levam os homens a destruir árvores e o habitat de inúmeras vidas. Enquanto minha mente divaga, sou sobressaltada pela constatação de que neste final de primavera minha wilde Heimat não recebeu a costumeira visita do Blechschmied (seu gorjeio de som metálico como o repicar de sino ficou ausente). Minha alma cismadora se confrange em apreensão. O que terá impedido sua anual visita?

Tenho lido também que em áreas centrais da cidade se percebe  um aumento de aves em busca de alimento nos pomares que resistem ao avanço implacável do concreto (em meados dos  anos 70 havia muitas  hortas e pomares,  como na casa do vô Max Schmidt, pai do saudoso Deputado Norberto Schimdt, que ficava na Borges, frente à entrada do Mauá). Mas o que estaria impelindo as aves para áreas urbanas? Desmatamentos? Defensivos agrícolas no cultivo da terra?

Em minha wilde Heimat vivem muitas aves. Como aqui tudo é orgânico, tem sobrado pouca fruta para Schmier. As uvas, as amoras, as ameixas,  as guabirobas e as peras (este ano a safra foi fraca) já foram degustadas pelas vidas que comigo partilham vida. Sobraram os butiás. Os figos estão começando a amadurecer. Preciso visitá-los diariamente ao amanhecer, antes dos passarinhos, para assegurar um pouco de Schmier no pão matinal (adoro Schmier de figo). A  safra de caqui em fevereiro promete, os  galhos estão pedindo estaca de apoio. Ainda não conferi  o Angá (Zuckerschote), nem o Araçá, mas as pitangueiras estão novamente em flor . Em março as goiabeiras, os ariticuns (Afferbäre)  e os abacateiros  estarão assegurando alimento para todos. Maravilha-me a abundância na mesa do Senhor. Maravilham-me os prodígios da  vida! Oprime-me a avidez humana.

 

*Gostaria de ser tudo, menos eu mesma! No mais profundo oceano, uma pedra, no distante firmamento, uma estrela  ... – Irma Lau