Adoro ler teus textos. A cena dos dois tocando violino, com essa "plateia", me emocionou, como te disse em outra mensagem. E já que estamos falando de "berço", muitas vezes os críticos das minhas posições sobre a reforma da Previdência ou a terceirização dizem que sou filhinha de papai e nasci em berço de ouro. Tanto isso é verdade que na crônica de domingo (um espaço que criei na ZH digital para me refrescar), escrevi no domingo passado:
Crônica de domingo
É verdade, eu nasci em berço de ouro e sou
filhinha de papai
Venho de uma família que soube compensar as carências
materiais com amor, dignidade e lições que nenhum dinheiro é capaz de
comprar
24/03/2017 - 21h08min | Atualizada em
26/03/2017 - 10h00min
Na discussão sobre temas indigestos, como a reforma da
Previdência e a terceirização, em que tento fugir das posições radicais, é
comum que leitores e ouvintes me acusem de ser uma "filhinha de
papai" que trabalha sentada, em sala com ar refrigerado, ou de ter nascido
em berço de ouro. E não é que essas pessoas têm razão? Sem a pretensão de
escrever uma autobiografia, vou contar a verdade: sim, eu nasci em berço de
ouro. Sim, eu sou filhinha de papai.
Sou a primogênita
de um casal de agricultores que em 1960 morava numa casa de chão batido, sem
luz, sem água encanada, sem conforto algum. Minha mãe tinha 18 anos. Meu pai,
25. Sou a filhinha de um homem íntegro e de uma mulher guerreira, que me deram
amor acima de qualquer bem material. Com as próprias mãos, meu pai serrou as
tábuas de pinheiro e fez o berço de ouro em que me abrigaram no frio de agosto.
Com palha de milho, que pela cor lembra ouro para quem é da roça, minha mãe
recheou o colchão em que sonhei meus primeiros sonhos.
As carências
materiais foram compensadas por tudo o que não tem preço: amor em abundância,
lições de dignidade, exemplos de ética, respeito, confiança, e incentivo para
seguir em frente. A filhinha do papai ganhou seu primeiro carro antes de
completar um ano de idade. Não exatamente um carro, mas uma carrocinha de duas
rodas, feita de madeira. A carrocinha servia de meio de transporte para ir de
casa até a lavoura e era nela que eu dormia ou ficava sentadinha, protegida
pelo Duque, um genérico de buldogue, enquanto o pai e a mãe trabalhavam na
terra.
Em berço de ouro
nasceram também meus quatro irmãos. Porque mesmo sendo muito pobres, nunca nos
faltou amor nem carinho. Cinco filhos em nove anos. Desde muito cedo,
aprendemos a dividir o pão, o leite e as frutas do pomar. Juntos inventamos
alternativas para a falta de brinquedos de loja. Cuidamos uns dos outros.
Ensinamos aos mais novos lições que aprendemos na escola, usando carvão feito
giz. Compartilhamos roupas, sapatos surrados e livros escolares. Trabalhamos na
roça no turno inverso ao da escola, às vezes rezando para chover e assim
escapar do sol inclemente. Aprendemos na prática o sentido de família.
A filhinha do papai
teve de sair de casa aos 10 anos, para estudar na cidade, porque ele decidira
que a educação seria a única herança do quinteto que dormiu em colchão de palha
dourada nos primeiros anos de vida. O pai e a mãe seguiram trabalhando na roça,
de sol a sol, para sustentar a prole. Ela costurava para aumentar a renda
escassa. Ele não refugava trabalho. À noite, ouvia rádio para saber o que se
passava no mundo. Os dois estiveram presentes em todos os momentos importantes
das nossas vidas, especialmente no dia em que cada um vestiu a toga e foi
diplomado.
Hoje não sou mais a
filhinha de papai. Há exatos dois anos somos cinco órfãos e uma viúva que
tentam, cada um a seu modo, sobreviver à ausência física preenchendo o silêncio
com as lembranças que ficarão para sempre, prova de que existe vida depois da
morte.
Falas de uma realidade em paulatina extinção: de uma
educação que não vem da escola, mas literalmente do berço, da família, que é a
fonte primeira, para o ser se humanizar e se transformar em pessoa social
e culturalmente rica. Pode o ser dispor de imensa riqueza material, se não se
humanizou, se não desenvolveu sensibilidade para a vida, se não
desenvolveu honestidade, senso de justiça, se não aprendeu a verter amorosidade
para dentro de si nem para com o meio em que vive, será um ser pobre.
DES. ELISEU GOMES TORRES
Ruy. Gente humilde ! Chico
Buarque, em sua fase pré-Lulla e pré- Lei Rouanett, segundo os maldosos,
escreveu uma página antologica da MPB , titulada GENTE HUMILDE. È a gente que é
incapaz de abusar, de imiscuir-se, de usar o que não é seu. E,singularmente,a
gente que é mais espezinhada e roubada por ladrões de todos os coturnos.
A esquerda brasileira sente calafrios quando se fala em segurança pública,
confundida desde sempre com o aparato de segurança de Estado que a ditadura
militar acalentava. Segurança Pública, hoje, seria “segurança do Povo”,
instituição que os governos não vislumbram. Falo da segurança de um pobre
operário que recebe a semana suada e vai para casa entregar à patroa para
comprar os gêneros de primeira necessidade para a família. É esse que está
sempre à mercê de um safado que, armado de um revolver alugado toma-lhe o
fruto do trabalho. Ou de outro, mais safado ainda que, de posse de uma caneta,
rouba-lhe a esperança e um mínimo de assistência médica e educação. Mas o povo
segue adiante.Gente humilde que dá vontade de chorar... Eliseu
...
FRANKLIN CUNHA
Prezado
amigo Ruy
Pois
vai outra história que completa tuas finas observações..
Nos
frios e escuros cubículos de um hospita público onde fazíamos o prenatal
de pobres mulheres que vinham da periferia de PA desde as 5hs, no recinto, dito
consultório, havia uma mesa e duas cadeiras. De um lado, uma mais ampla,
estofada, macia e do outro, uma de ferro, dura, fria .As pacientes , ao entrar,
reflexamente sentavam na cadeira de ferro.Um belo dia, troquei as cadeiras: a
estofada para elas e a de ferro para mim.Então, passei a ver que as grávidas
,ao entrar, olhavam, hesitavam um pouco e sentavam na dura e fria
cadeira de ferro no lado da mesa que habitualmente era ocupado por mim.
É
como bem dizes, fatos de um Brasil simples, de boa índole, cordato ( a meu
ver até demais)..
São
histórias para um segundo livro de tua lavra, que se me deres a honra,
prefaciarei, de novo e com grande prazer..
Abraço.
Franklin
Cunha