Eu passei uma crise séria anos atrás. Tinha me separado, isso nos anos 80, deixado uma bela casa com três terrenos no Bairro São José, São Leopoldo, tudo casas classe A, para minha ex e nossos filhos.
Me mudei para P. Alegre e comprei uma casa na rua Flamengo, em Ipanema.
Aí tive uma relação complicada, para dizer o menos, acho que a culpa foi minha. Deu tanto rolo que achei por bem deixar essa casa com a pessoa com a qual me desaviera e fui morar num apezinho muquirana, mobiliado, lá na rua Álvaro Alvim, bairro Petrópolis.
Me impus um período de quarentena, não saía com ninguém, só trabalhava.
Nesse meio tempo minha ex achou melhor morar em P. Alegre.
E eu resolvi voltar para a enorme casa de São Leopoldo, que estava precisando de um horror de reparos. sabe como é casa, né?
Tirei licença prêmio e eu mesmo comecei a lixar, pintar, ajeitar. Tinha um colchão de casal no chão do dormitório, mais um desses refrigeradorzinhos de motel vagabundo. E um fogão usado.
Mas fui indo, lambendo feridas e resolvi ter uma horta e um galinheiro.
Eu mesmo construí o galinheiro e cerquei a horta. Lembrem-se que eram três terrenos.
Fui na casa da minha mãe em Santa Cruz ( eu tinha uma D 20 diesel cabine simples) e trouxe umas dez galinhas e um galo.
Meu vizinho, que era estrangeiro, começou a amolar, dizendo que o galo tirava seu sono.Mas fui levando na manha.
Até que o filho de um amigo que me visitava disse que eu tinha que espalhar um preparado contra pulgas nesse galinheiro e se ofereceu para ir comprar e aspergir.
Um dia depois as galinhas apareceram com a crista entre o azul e o preto e começaram a morrer. Peguei uma mangueira e meti-lhe água para remover aquele preparado que era, evidentemente, o causador dos óbitos galináceos. Morreram todas as galinhas e os pintos. Só sobrou o galo e um pintinho, daqueles de pescoço pelado.
Incrível, o galo e o pintinho passaram a dormir juntos no ninho dos ovos, uma caixa de madeira. O galo meio que bancando a galinha choca. Mas o galo tinha uma mancha preta na crista e vi que definhava. e eu fazendo de tudo para salvar os dois. Essa agonia levou mais dois dias. Ao amanhecer ouvi o pintinho piando meio desesperado.
Fui no galinheiro e o galo tinha falecido.
O pintinho denotava vigor e boa saúde.
Tirei-o do galinheiro e lhe dei milho quebrado e água, colocando-o dentro de casa.
E agora?
Peguei a D 20, coloquei o pintinho numa caixa de papelão e me fui para a casa da minha mãe em S. Cruz. A mãe tinha também um galinheiro em seu terreno, a duas quadras da Catedral, em pleno centro. Alguns denunciavam isso às autoridades sanitárias mas ela resistia dizendo que galinhas eram mais limpinhas do que cachorro e gato.
Bueno, passei o pintinho para a mãe.
Ela o criou e a cada tanto eu ligava para ela perguntando como é que ia o sobrevivente.
O pintinho virou galinha e chegou a hora de resolver o que fazer .
Peguei minha D20, fui a Santa Cruz, peguei a galinha e voltei pela RS 287. Na altura do Pinheiral havia várias casas de colonos, cheias de galinhas na frente. Estacionei perto de onde estavam e soltei a minha sobrevivente, que logo se incorporou ao grupo.
Nunca soube de seu destino.
Mais adiante conto outras emoções como do gato Robespierre, do cachorro Dingo e de outros animais aos quais me afeiçoei.