A Estratégia das Feministas
é Equivocada?
é Equivocada?
Franklin Cunha
Médico
U ma
escultura em osso de vinte mil anos encontrada nos Pirineus mostra uma mulher
transpassada por uma lança arrastando-se de gatinhas, enquanto um homem
agachado lascivamente atrás dela tem o claro objetivo de uma penetração sexual,
embora o volume dos seios e do ventre indiquem que ela está grávida. Em uma
característica definição da ideia que o homem primitivo teria dos jogos
sexuais, o antropólogo francês G.H. Luquet interpreta tal repelente
representação como um “amuleto de amor” !
O
cerne das lutas feministas atuais coloca em questão todo o imaginário masculino
através dos tempos, o qual não considerava as mulheres como seres humanos. Essa
ideia ao longo dos séculos pouco se modificou. No concílio de Macon (França,
ano 585), por exemplo, o tema discutido durante um mês por centenas de cardeais
foi a mulher, como e onde classificá-la, já que, segundo os príncipes da
Igreja, ela não faria parte da espécie. E hoje, como consequência desse
imaginário, a repelente cena primitiva de ataque e posse sexual se repete – real
e simbolicamente – em todos os estratos sociais. E com muita frequência, pouca
divulgação e rara punição. No entanto, se a visão das bravas feministas
continuar sendo filtrada apenas através da ótica sexual, a luta será limitada e
os resultados frustrantes.
Quando
Marx disse que “a liberdade da mulher passa pela liberdade do homem”, pensou em
conquistas bem mais amplas do que o exercício livre e recreativo da
sexualidade. A reivindicação de igualdade entre homens e mulheres no plano dos
direitos coincide historicamente com o início das lutas pela igualdade dos
homens entre si. As conquistas masculinas, no entanto, foram bem mais amplas e
rápidas do que as femininas. Provavelmente devido à equivocada estratégia
adotada pelas mulheres.
Na
verdade, a opressão androcrática não imperava em todos os povos primitivos, mas
acabou se impondo pela violência e derrotando as sociedades matriarcais.(apud
Mutterrecht-
Bachoffen)
Hoje – lição apreendida – sabemos que a opressão da mulher não se resolve
tentando derrotar o homem. A tática das alternativas (vitória/derrota) na luta
entre os sexos é uma arma de domínio masculino. E é essa tática que a mulher
deve recusar. Suas escolhas não podem se direcionar para uma participação no
poder masculino, mas no questionamento do conceito global de poder, na forma
como ele está culturalmente instituído e legalmente sacramentado.
A
igualdade hoje oferecida à mulher, adereçada como um princípio de justiça, é
armadilha apetitosa, porém letal. O princípio justo é o que respeita as
peculiaridades e as diferenças dos seres humanos. Além das de natureza
biológica – vitais para a espécie e onde a mulher tem árdua e inevitável
participação – a mais importante é a milenar exclusão feminina da história. Os
objetivos dos homens foram impostos por meio de uma truculenta coerção, sendo
que todo o edifício social foi construído com rígidos módulos nitidamente
másculos. Dentro dele é onde se permite a movimentação da mulher. Ao pássaro
cativo e decorativo abriram-se algumas janelas, mas ele continua engaiolado.
A
estrutura legal, a organização laboral, científica, artística, o psiquismo
coletivo, a religião, a linguagem, enfim toda a cultura, está elaborada e
ajustada de acordo com as prerrogativas dos homens. Nessa perspectiva a maioria
dos discursos sobre a igualdade entre os sexos é apenas retórica dissimuladora
da subjugação feminina.
Ao
tentar se elaborar uma solução para o futuro, implica em nosso conhecimento do
passado.O surgimento da propriedade privada originou um desequilíbrio entre os
sexos com demarcação de espaços: o doméstico para a mulher e o público para o
homem. No entanto, interpretar somente em bases econômicas nosso destino
histórico deixa sem explicação um fenômeno do qual se ignora o impulso motor
primordial.
Nem
o materialismo histórico, nem a psicanálise, nem o estruturalismo (ou outros ismos)
indicam claramente o mecanismo emocional determinante da passagem da
propriedade comunal à propriedade privada. É fato consensual (e lamentável) ser
a satisfação dos instintos a conduta orientadora do ser humano no contato com o
outro sexo. A chave da questão parece estar no arquétipo do instinto de posse,
no primeiro objeto concebido como seu pelo homem: o objeto sexual.
A
estratégia feminina, portanto, deverá - a nosso ver e pensar – se empenhar em
remover do inconsciente masculino a sua primeira presa, na tentativa de
extirpar o núcleo primitivo dessa ancestral patologia possessiva, complexa
mistura de eros e tânatos
Talvez
nessa tarefa devam ajudá-las menos os antropólogos, sociólogos ou psicólogos e
mais intensamente os etólogos.