Filosofia,
música, a comunicação humana e a verdade
George
Steiner em” Nostalgia do Absoluto”, pergunta “Tem futuro a Verdade? Responde
que em nosso cérebro a busca da verdade está fatalmente impressa. Pela dieta,
clima, pelos excedentes econômicos que inicialmente puseram em
funcionamento a potencialidade inata daqueles milagrosos e
perigosos seres humanos, os antigos gregos, para uma grande e continuada
explosão de gênio. E o fizeram através da filosofia que é a arte de fazer
perguntas.
Citando
Heidegger, Steiner repete que as perguntas são a devoção, a oração do
pensamento humano. E que nós, ocidentais, somos animais construídos para
formular perguntas e tratar de conseguir respostas custa o que custar.
Mas
o que seria a Filosofia? J.P. Feinmann, o filosofo argentino atual responde: Ӄ
um estado aberto, uma correspondência com o ser com o qual queremos nos
comunicar e permitir seu e nosso desocultamento. Seriam momentos específicos ,
nos quais se dá uma comunicação profunda, uma comunicação espiritual. E esses
momentos encantados podem se dar através da palavra, do exemplo de vida, da
música.
No
filme de Polanski, O Pianista, há uma cena em que um oficial nazista encontra
um judeu escondido dentro de uma casa em escombros. Estão separados por mil
coisas não há nada que os una. Há um piano e o nazi pede que execute algo. O
pianista, que era polaco, toca nada menos do que uma sublime partitura, a
balada nº 1 de Chopin.
Ocorre
então entre eles uma mediação da arte através da música e isto está à margem da
história e da temporalidade, é enfim, uma comunicação filosófica.
O
estranho, diz Feinmann que Heidegger dava pouca importância à música.
Mas
houve uma ocasião em que o filósofo talvez tenha entendido e gostado de uma
melodia. Depois da guerra, quando estava sendo submetido a um processo
por ter colaborado com o nazismo, o filósofo se asilou na casa de um amigo.
Este, tentando agradá-lo toca uma sonata de Schubert. Heidegger a escuta e diz:
“Isto não podemos fazer com a
filosofia”.
Romain
Rolland, escritor e musicólogo, ao receber uma visita de seu amigo Gandhi
executou para o indiano o Noturno OP.9 nº 2 de Chopin. Gandhi
nada entendia e percebia na música europeia, diferente da música indiana em
harmonia, andamento, ritmo e melodia. Ao concluí-lo, Roland perguntou se tinha
gostado, Gandhi respondeu “Se o amigo o tocou deve ser uma linda melodia”.
Steiner
também conta que uma vez Schumann executou um de seus estudos sinfônicos para
piano e quando o finalizou um dos assistentes perguntou: “Mestre? O que
significa esta música, o que quiseste dizer com isso”? Schumann o olhou
fixamente e tocou de novo o estudo. E essa foi a resposta.
Em
tempos sombrios a verdade para vencer a mentira deve ser repetida sempre e
sempre como tentou Schumann, como faziam os filósofos gregos há dois mil anos e
a grande música do ocidente até hoje.
Franklin
Cunha
Médico
Membro
da Academia Rio-Grandense de
Letras