quinta-feira, 9 de abril de 2015

SOBRE JORNALISMO, SOBRE JORNAIS. MEU BLOG É DEMOCRÁTICO, ARTIGO DO DR.GUIMARÃES OLIVEIRA


Bela intervenção do jornalista José Cruz neste debate.  Todavia, faltou o detalhe que também ajudou a empurrar o jornalismo impresso para o seu ocaso:  a falta de isenção e de pluralidade dos jornais. Sem um marco regulatório, aqui no Brasil, que evitasse a concentração exagerada de poder empresarial nas mãos de poucos, a imprensa privada do nosso país acabou concentrando 90% das editorias sob o controle férreo de apenas 7 famílias.

 

E estas 7 famílias, é claro, colocaram os interesses empresariais de seus mega-oligopólios de mídia como item n.º 1 da sua lista de prioridades, na hora de decidir quais notícias publicar e com qual viés fazê-lo. Nossa imprensa privada começou a aliar-se a correntes políticas favoráveis aos interesses de seus negócios empresariais, passando a fazer o uso da notícia como instrumento para favorecer seus próprios negócios, para interferir nas decisões de eleitores e não para, exatamente, informar os seus leitores. Este fenômeno foi bem referido e previsto há 35 anos pelo professor Sérgio Capparelli, nas aulas magistrais do curso de Jornalismo da PUC-RS que freqüentei.  Disso resulta hoje que os grandes jornalistas e articulistas existentes são profissionais muito talentos, mas que resultaram “pautados”, aprisionados em jaulas mentais dentro das redações, por ordens de seus chefes de editoria.  Os jornais hoje nivelam o noticiário entre o que é “liberado”, de acordo com a visão dos interesses empresariais e lucrativos do editor, do que é tabu, assunto impublicável, porque contraria aqueles interesses, o que é lamentável. 

 

Isto “matou” o elemento que é da essência do jornalismo: a diversidade e a pluralidade de opiniões e de idéias sobre as notícias e os assuntos. Na Copa do Mundo, todos sabem, a imprensa nacional cumpriu o papel feio que lhe impôs aqueles 7 famílias, divulgando a rodo que o Brasil não estava preparado nem tinha competência para sediar uma Copa do Mundo no denominado “padrão FIFA”.  Algumas publicações estrangeiras embarcaram nesta onda e, confiando no que estava sendo publicado pela nossa imprensa, chegaram a repercutir esta impressão lá fora. Quando a Copa estava por iniciar-se e, junto com ela, jornalistas do mundo inteiro aportaram por aqui e viram, com seus próprios olhos, que aquelas previsões apocalípticas da nossa imprensa, sobre a incapacidade do Brasil para sediar uma Copa, não eram verdadeiras e, pior, não eram sinceras, porque o alvo era o desgaste do governo federal para fins eleitorais nas eleições de outubro, a imprensa internacional deacreditou-se na imprensa brasileira.  E o país que faria mico na Copa entregou ao mundo a “Copa das Copas”, segundo respeitáveis editores da imprensa de fora.  Foi nisso que deu, então, esta falta de pluralidade: o total descrédito que hoje se abate sobre a nossa imprensa, de parte dos jornalistas do mundo inteiro.  Por fim, outro fato curioso sobre isso:  com todos os jornais apoiando, alguns ostensivamente, candidatos de oposição, sendo que no segundo turno este apoio em relação ao candidato oposicionista atingiu as raias do absurdo no caso Veja, o que ocorreu é que os eleitores brasileiros, em sua maioria, votaram na candidata da situação.  Em resumo: a imprensa nacional vive hoje um grande e colossal descrédito, seja fora ou dentro do país.

 

Dias atrás, me ligaram da Zero Hora, com uma oferta “imperdível” de assinatura.  Minha resposta foi esta:  “por que é que vou pagar todo mês para um jornal tentar ma enganar todo dia, se disponho de um exército de gente tentando fazer isso de graça a todo instante?” O interlocutor nem respondeu e encerrou a ligação.  

 

Um outro aspecto que penso esteja hoje ajudando a corroer ainda mais a credibilidade do jornalismo (inclusive o jornalismo eletrônico) é o excesso de opinialismo, a ancoragem desmedida e o analisecismo exacerbado.  Explico. Toda vez que uma notícia é divulgada, o veículo de imprensa acha que precisa escalar alguém para “explicar” ou “traduzir” ao leitor ou telespectador o que esta notícia deve significar para ele. Trata-se de uma espécie de paternalismo mental atávico. Os donos da imprensa, ao fazerem isso, subestimam a capacidade mental dos consumidores da notícia que divulgam, como se fossem incapazes de analisá-la e de chegarem às suas próprias conclusões.  Então, surge a notícia e, em seguida, aquele comentarista, o âncora, o expert, aquele ou aquela que virá para dizer como este consumidor da notícia deve recebê-la e como deverá preocupar-se com ela. Ou seja:  para a imprensa, os consumidores de notícias são todos mentecaptos, incapazes de concluir alguma coisa por si mesmos!

 

O mais incrível é que a imprensa nacional praticada pelos grandes grupos de comunicação conseguiu chegar hoje a um resultado constrangedor, de falar uma só língua, de ter uma só opinião formada sobre toda e qualquer notícia, ao comentá-la e explicá-la de forma igualitária em suas implicações e significados.  Não há contra-ponto.  Toda a imprensa fala sobre as mesmas coisas e utiliza a mesma forma de linguagem, a mesma interpretação, num mesmo estado mental onde todos pensam da mesma forma.  Ora, os recebedores das informações seriam, nesta ótica, terminais-burros que só servem para pagar por notícias e receber aquelas que os donos da mídia dizem que são importantes, já mastigadas devidamente por um analista. E este consumidor da notícia deve considerar apenas o que o analista irá dizer sobre a notícia. Então, dar a notícia apenas não basta, é preciso que alguém venha dizer o que ela significa para o estúpido do recebedor dela.  Ora, os recebedores de notícias de hoje, desde que tenham recebido alguma instrução, são pessoas que receberam 70 vezes mais volume de informações do que os seus pais. E estão criando filhos que irão receber 70 vezes mais informações do que eles.

 

Será mesmo que este grande público consumidor de notícias precisa de alguém que as mastigue e as interprete?  Ainda mais sendo pessoas que vivem hoje num ambiente de interação global, sem fronteiras e em tempo real.  O que os donos das redações de hoje em dia ainda não se aperceberam é que o seu público alvo mudou muito. Ele é formado atualmente, em grande parte, por pessoas que possuem opiniões próprias sobre os mais variados assuntos. O jornalismo, então, deveria servir-lhe as notícias, sem esta mastigação toda, feita, não raro, por quem não entende nada do que está tratando. É neste ponto que o consumidor da notícia sente-se manipulado ou tratado como se fosse incapaz de receber a notícia. E quando ele ouve a explicação do âncora, irá querer dizer, muitas vezes, “ei, espera aí, isto não é bem assim...” ou “não vejo esta informação desta maneira...”. Então, frustrados, estes consumidores de informações vão aos poucos migrando de mídia informativa, vão procurar um ambiente que não lhes cause esta frustração, onde possam receber a notícia sem mastigações e onde possam exercer o seu contraponto, praticando algo que não existe no jornalismo tradicional: a interatividade. Irão para um ambiente em que não sejam tratados como terminais-burros de informações. Neste ambiente, serão agentes de integração e de interpretação das informações, interagindo e se expressando com muitas outras pessoas. Este ambiente, é claro, é o da Internet. É o das redes sociais. Não é sequer o do jornalismo eletrônico.

 

Então, a tentativa de manipulação da informação e/ou a subestimação do público consumidor de notícias, com a imposição de um paternalismo exacerbado e pouco isento sobre este público, é o tiro-no-pé que a imprensa dispara, o buraco que ela cavou para cair dentro.  A concepção toda na forma de lidar com a informação está ultrapassada e defasada., Não se pode mais admitir a idéia de entregar a notícia sob a embalagem de um descomunal paternalismo, em que a notícia deva ser servida repleta de palpites de âncoras, de analistas e de supostos experts, todo mundo mastigando esta notícia, porque o público recebedor não aceita mais o papel de terminal-burro de informações. Explicar ao consumidor da informação aquilo que ele já concluiu por si mesmo é o grande erro cometido pela imprensa nacional.  Já é possível hoje debater a aprofundar qualquer tema em fóruns de troca de informações das redes sociais. O jornal que não compreender que não se pode mais subestimar o próprio público morrerá cedo e logo.

 

Att. Rogério