domingo, 9 de outubro de 2016

UM CERTO SENHOR JULIO PRATES

Fui Juiz de Direito em Santiago lá por 1975. Eu era um gurizão de menos de trinta anos.
Santiago era um  ninho de águias no campo do Direito. Eram menos de 15 advogados. Todos muito preparados e estudiosos.
Fiquei dois anos, fui promovido, fui embora  e a vida me fez voltar, eis que me casei com Maristela, já homem maduro.
Nunca havia ouvido falar de Júlio Prates.
Eu não lia os blog locais e tinha um círculo restrito de amigos.
Até que me contaram que tinha um blogueiro que estava "sampando" o pau em mim.
Mandei um mail a ele dizendo que, por incrível que pudesse parecer, tínhamos amizades em comum, como Bisol, Olívio Dutra, Tarso Genro.
E fomos nos falando, eu estranhando que o PT tinha nascido, se criado e envelhecido sem nunca ter passado por Santiago.
Algum tempo depois me indignei com uma posição dele e me afastei.
Tempos depois me encontrei com ele e  sua então esposa e os convidei para um lanche na minha casa em Xangri La.  Brincando, lhe disse:
- faz um filho nessa guria, que não vais te arrepender.
Depois , para minha surpresa, se separaram.
Júlio começou  sangrar publicamente como nunca vi em qualquer literatura nacional ou de outros países.
Expunha no seu blog toda sua tragédia pessoal, deixando verter sangue e mais sangue de sua alma.
Num dia de chuva  fria, Rudolf e eu fomos levar uma pizza lá onde ele morava sozinho.
Chocante a qualidade de seus livros eruditos, chocante sua solidão. Seu abandono, sua carência afetiva.
Eu sempre disse que a vida castiga as pessoas inteligentes, tanto ricas como pobres.
É mais fácil os burros e ignorantes serem felizes do que a pessoa  flagrada das coisas. Quem gosta de Beethoven sofre; quem gosta de pagode mostra as canjicas e é feliz.
Não entendo como não aproveitam melhor o Júlio nas faculdades locais. Claro, ele é revoltado, controvertido, iconoclasta.  Mas toda unanimidade é burra.
Hoje, na região de Santiago, muitos escrevem bem. Mas Júlio se destaca.
As crianças, os pobres, os humildes, gostam dele.
Já disse a ele  que cuide melhor de sua profissão de advogado, onde ele é muito bom e vire a folha de seu infortúnio conjugal.
Eu não gostava dele.
Hoje gosto e o apoio.
Ele é um repositório de cultura.
E toda a cidade tem que ter seu maldito. Nem que seja para apontar que os reis estão nus.