terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

ARTIGO DE FRANKLIN CUNHA

 PODER, MEDO E RAZÃO

O historiador e jornalista italiano Guglielmo Ferrero, escreveu em seu livro O Poder a respeito do medo paranoico que sofrem os ditadores. Contou que em pleno regime fascista, foi convocado pelo prefeito de Florença, em outros encontros risonho e gentil, estava agora com semblante negro e inquisitorial ao lhe entregar uma carta de Benito Mussolini que entre outras admoestações dizia: "Lembro ao Signore Ferrero que a Revolução Francesa tratava seus inimigos de maneira muito diferente". Ao sair do Palácio Riccardi, Ferrero se perguntou que crime tinha cometido para que o ditador poderoso lhe mostrasse a guilhotina como término de sua carreira?.

Tudo foi originado por um texto no qual Ferrero zombava das frustradas lutas pela liberdade, pela democracia e pelos direitos civis que acabaram por entregar a Itália às mãos de um ditador. Na ocasião, a Itália desmoronava por todos os lados e, por isso, tinham sido conferidos plenos poderes a um ditador para que ele evitasse a definitiva debacle do país.

Então, no meio dos monstros que devia matar  para cumprir sua hercúlea tarefa, o déspota deixava-se tomar pela paranoia provocada por algumas linhas escritas por um opositor político incipiente e fraco.

Para Ferrero, os detentores do poder aspiram a conservá-lo, os amedronta a lembrança de sua transitoriedade e que uma democracia só é legítima quando a possibilidade de sua renúncia e substituição é algo que pode se realizar quando os eleitos frustram as esperanças de seus eleitores.

Opinião semelhante tinha Isaiah Berlin quando disse que a verdadeira democracia não se resume à eleição de candidatos nos quais confiamos, mas também na possibilidade de destituí-los no momento em que verificamos terem eles fraudado justas e legítimas expectativas. "Ser liberal", afirmava Berlin, "não é somente aceitar opiniões divergentes, senão admitir também que são talvez nossos adversários os portadores da razão".

Nada, portanto, mais antiliberal e mesquinho do que retaliá-los com ações discriminatórias e ressentidas quando eles questionam e denunciam a precariedade legal e consensual dos detentores do poder, principalmente quando sobre eles pesam acusações de arbitrariedades e de corrupção.

 

Franklin Cunha

Médico

Membro  da Academia Rio-Grandense de Letras