TITO GUARNIERE
OREMOS
O atentado contra Bolsonaro
era, de certo modo, previsível. No grau de radicalização em que está lançada a
política brasileira, alguma coisa tinha de acontecer. Os sinais estavam dados
há bastante tempo, diante dos nossos olhos. Foi Bolsonaro a vítima, poderia ser
Haddad ou Ciro ou outro qualquer.
O gravíssimo incidente até
que tardou, na espiral de violência verbal, intolerância e ódio, que vem se
espalhando insidiosamente em todas as instâncias da vida política nacional, nos
últimos anos, nos últimos meses. Não há uma única voz no cenário conturbado que
suavize o discurso, que desfralde a bandeira branca, que interrompa a marcha da
insensatez.
Cada personagem da luta –
agora sangrenta - eleva o tom de voz, berra mais alto, pousa de valentão, puxa
briga. No combate sem fim e sem medida não há turma do deixa disso. As
labaredas sobem aos céus, e ao lado só estão aqueles que jogam mais gasolina no
fogo.
Os militantes de facções e
partidos, armados até os dentes de raciocínios obtusos, passam ao largo do
debate civilizado e necessário, na hora crucial. O embate político é um palco
obscuro de impropérios, de clichês ofensivos, e ao mais leve pretexto os atores
da tragédia perdem limites e estribeiras, partem para o ataque selvagem.
A mídia faz a sua parte.
Está sempre em guarda para obter alguma declaração dos personagens do jogo
estridente, mas só para os efeitos de colher a manchete do dia, dando
preferência a alguma injúria lançada contra o inimigo. O eleitor aturdido
imagina que os políticos vivem assim, e apenas assim, às turras, aos
contrafeitos, no embate primitivo de quem xinga mais e melhor. Os programas de
governo, os projetos para o país, de onde virão os recursos para as promessas
sempre renovadas, nenhuma tevê, emissora de rádio ou jornal se incomoda em
esmiuçar. O que vale é a contenda, a briga de cachorros loucos.
A mídia, quando entrevista
um candidato, como no Jornal Nacional, age como implacável acusadora.
Interrompem a fala, lembrando o pobre entrevistado de quantos pecados ele ou os
seus aliados (possivelmente) cometeram e de quantos ainda vão cometer. É (o
candidato) como um bandoleiro no banco dos réus, e não um candidato
presidencial em uma bancada de tevê. Não há espaço para um único, miserável e
piedoso reconhecimento de mérito. Não é entrevista, é interrogatório policial.
A população, em estupor, é levada a crer que ninguém presta.
Nas redes sociais o clima é
de guerra civil. As vozes cavernosas que dali ressoam, tecem loas fanatizadas
às virtudes reais ou imaginárias dos seus candidatos, na mesma medida em que
detonam os inimigos, vociferando, em termos raivosos e chulos. Desnudam por
escrito a própria inconsequência e pobreza mental, o primarismo dos seus
argumentos, logo a partir das agressões que cometem contra o vernáculo e o
idioma pátrio.
O atentado a Bolsonaro só
escancara, mais uma vez, que fracassamos como país, como nação e como povo. Não
há uma única voz lúcida que nos dê um sinal, um só sinal. Este país, do jeito
que está não pode fazer nada por nós. E, bem pior, nós também – perplexos,
impotentes – nada podemos fazer por ele, a não ser orar.