Sou
descendente de uma família católica, extremamente religiosa.
Meus
tios Huberto, Guido e Afonso foram seminaristas no Colégio Santo Inácio,
em Salvador do Sul, antigamente Kappesberg. Afonso foi ordenado padre jesuíta .
Vive em Curitiba. Por sinal, tem vários livros publicados e usa o pseudônimo
Afonso de Santa Cruz.
Natural,
portanto, que eu fosse convidado a também me tornar seminarista. Por que não?
pensei. E lá me fui, mal terminado o primário. De Santa Cruz partiu, de ônibus,
uma leva de piazinhos como eu.
O
Colégio Santo Inácio tinha três divisões, por faixas etárias e cada uma
tinha seu próprio dormitório e sala de estudos. Como um menino urbano, me
surpreendi com a rusticidade de vestes e modos, dos que vinham das “ colônias
novas”, Cerro Largo, Itapiranga, etc. Seus calçados eram umas
sandálias feitas de recorte de pneus, com tiras de couro cru. Fortíssimo
seu sotaque, tanto alemão, como italiano. Mas neles habitavam alminhas
generosas.
As
refeições eram frugais. As pessoas sentavam-se à mesa em grupos de 14,
sete de um lado, sete de outro. Cada dia se trocava de lugar até
chegar na ponta. Por vezes quem ficava por último tinha que se contentar
com o pouco que restava.
.
Havia o estudo sério ( para fazer os temas) e o estudo livre ( em que era
permitido ler livros de aventuras ou histórias). Não se podia dar um pio.
Não havia chuveiros. Para banhos usava-se uma piscina escavada na rocha.
Banho frio, inverno e verão.
O
dia começava de madrugada, com ginástica no pátio. Depois, missa e após aulas.
De tarde, após o almoço, aulas até 15,30. Depois, um pedaço de pão com chá e,
em seguida, trabalhos. Os filhos de colonos iam trabalhar na roça enquanto que
os urbanos como eu ou iam para a cozinha, descascar batatas, ou consertar
livros na biblioteca.
Podia-se
ir para casa só em dezembro. Em julho, por ocasião dos festejos de Santo
Inácio, era permitida a visita de parentes.
As
correspondências, tanto que a gente mandava, como as recebidas, eram lidas pelo
Padre responsável.
À
noite, no vasto dormitório, uma caminha ao lado da outra, eu seguidamente
ouvia gente chorando bem baixinho de saudade dos pais e irmãos.
Não raro algum fazia xixi na cama.
Agora
vem a parte boa: estudava-se latim, grego, inglês, espanhol, sendo oferecidos
também alemão e italiano. E todas as matérias humanistas e de ciências exatas.
Também se podia aprender uma série de instrumentos musicais.
De
diversão, só andar de bicicleta e jogar futebol, em horários rígidos. E
muita e férrea disciplina.
Fiquei
só dois anos. Cada vez que voltava, depois de um ano fora, quase não reconhecia
minhas irmãs. E elas se admiravam de eu desconhecer as novas gírias da
cidade. Achavam que eu havia me transformado num Robinson Crusoe,
apavoravam-se de eu sempre colocar o chuveiro para o frio, de arrumar minha
cama depois de levantar.
Num
próximo capítulo narrarei com foi minha readaptação ao voltar, longe de pai e
mãe, nessa idade tenra, por dois anos inteiros.