O som do silêncio
Recentemente,
em São Paulo, um morador matou um casal de vizinhos em decorrência e
agravamento de uma sucessão de reclamações por causa de quebra de silêncio
condominial. Tragédia. Uma reação extremada num fato comum.
Agora, a
exemplo de edições anteriores da Oktoberfest, novamente a vizinhança relatou
abusos sonoros e incômodos gerais decorrentes da festança. Não é um problema
restrito a festa de outubro e ao local. É um problema generalizado. A qualidade
da convivência social está em acelerado processo de degradação.
Faz tempo,
as ruas foram invadidas por carros exageradamente sonorizados, pilotados por
inquietos condutores, com uma mão no volante e outra na buzina, ou no volume do
equipamento de som. Regra geral, o que ouvem em altíssimo som e afirmam que é
música, é apenas um ritmado “pancadão” de melodias e letras de duvidosa
qualidade. Um “bate-estaca”.
Também é
comum a publicidade ambulante em extravagantes e automotivos serviços de som.
Defronte algumas lojas, as calçadas são ocupadas por locutores equipados de
microfones e alto-falantes, anunciando a promoção do dia, a oferta da hora.
Difícil imaginar que tais práticas possam atrair clientes. Ou fidelizar
negócios.
E o que
dizer dos comemorativos fogos de artifícios disparados a qualquer pretexto,
quase sempre à noite, para susto e desespero de doentes, crianças, velhos,
pássaros e animais domésticos? Não deveriam ser simplesmente proibidos de
fabricação e comercialização?
Todos esses
excessos são a prova da falta. Excessos que provam a falta? Como assim? Falta
de reflexão, falta de fraternidade, falta de companhia, falta de civilidade,
falta de educação, falta de respeito, falta de autoridades. Uma sucessão de
faltas pessoais e coletivas.
Indivíduos
que precisam dizer ao mundo de sua existência, de sua presença, de sua
“opinião”, de sua “não solidão”. Infelizmente, fazem tudo isso, se “comunicam”
através dos exageros pessoais. E entre eles o pior. O excesso de som. Ruídos. O excesso de não silêncio.
As
expressões de alegria e felicidade, de presença, inclusive, não precisam ser
ruidosas. Há muita beleza e poesia no silêncio. E autoconhecimento. O som do
silêncio ecoa como nenhum outro som. Ressoa na alma. Mas esse é um som
especial. É preciso querer ouvir. Saber ouvir. E desejar ouvir.