quarta-feira, 23 de outubro de 2013

O DIREITO AO SILÊNCIO - MAGNÍFICO ARTIGO DE ASTOR WARTCHOW


O som do silêncio

 

Recentemente, em São Paulo, um morador matou um casal de vizinhos em decorrência e agravamento de uma sucessão de reclamações por causa de quebra de silêncio condominial. Tragédia. Uma reação extremada num fato comum.

Agora, a exemplo de edições anteriores da Oktoberfest, novamente a vizinhança relatou abusos sonoros e incômodos gerais decorrentes da festança. Não é um problema restrito a festa de outubro e ao local. É um problema generalizado. A qualidade da convivência social está em acelerado processo de degradação.  

Faz tempo, as ruas foram invadidas por carros exageradamente sonorizados, pilotados por inquietos condutores, com uma mão no volante e outra na buzina, ou no volume do equipamento de som. Regra geral, o que ouvem em altíssimo som e afirmam que é música, é apenas um ritmado “pancadão” de melodias e letras de duvidosa qualidade. Um “bate-estaca”.

Também é comum a publicidade ambulante em extravagantes e automotivos serviços de som. Defronte algumas lojas, as calçadas são ocupadas por locutores equipados de microfones e alto-falantes, anunciando a promoção do dia, a oferta da hora. Difícil imaginar que tais práticas possam atrair clientes. Ou fidelizar negócios.

E o que dizer dos comemorativos fogos de artifícios disparados a qualquer pretexto, quase sempre à noite, para susto e desespero de doentes, crianças, velhos, pássaros e animais domésticos? Não deveriam ser simplesmente proibidos de fabricação e comercialização?

Todos esses excessos são a prova da falta. Excessos que provam a falta? Como assim? Falta de reflexão, falta de fraternidade, falta de companhia, falta de civilidade, falta de educação, falta de respeito, falta de autoridades. Uma sucessão de faltas pessoais e coletivas.

Indivíduos que precisam dizer ao mundo de sua existência, de sua presença, de sua “opinião”, de sua “não solidão”. Infelizmente, fazem tudo isso, se “comunicam” através dos exageros pessoais. E entre eles o pior. O excesso de som.  Ruídos. O excesso de não silêncio.  

As expressões de alegria e felicidade, de presença, inclusive, não precisam ser ruidosas. Há muita beleza e poesia no silêncio. E autoconhecimento. O som do silêncio ecoa como nenhum outro som. Ressoa na alma. Mas esse é um som especial. É preciso querer ouvir. Saber ouvir. E desejar ouvir.