domingo, 27 de outubro de 2013

IDIOMAS - LISSI BENDER, QUE CONCLUI SEU DOUTORADO NA ALEMANHA ,COMENTA


Lendo sobre diversidade linguística em teu blog, lembrei-me de uma recente entrevista de radio em que falávamos sobre a língua alemã presente na região de Santa Cruz. A certa altura dizia-me o entrevistador que a percebia envolta ainda em muito preconceito e me perguntava como eu avaliava a situação.

Quantas vezes ouço pessoas se desculpando pelo alemão que falam quando falam comigo. “Sabe como é, eu falo esse nosso alemão da colônia”; “Meu alemão é um Hunsdeutscht”; “Falo esse alemão errado nosso”; “Falo alemão quebrado”; “Tenho vergonha de falar"; "Você fala esse alemão bonito”; “você fala alemão certo” e por aí vai.

Preconceito linguístico é um dos mais entranhados na sociedade. Acresce-se a isto que o Brasil registra uma longa história de desconstrução, para não dizer destruição de sua diversidade linguística. De todas as medidas, neste sentido, a campanha de Nacionalização do Ensino e da Língua foi a mais funesta. Fez com que os falantes se perdessem do imensurável valor que a sua língua representa para a diversidade linguística brasileira, para a riqueza cultural que sua língua suporta, do seu potencial para o enriquecimento do país.

Esse valor foi desconstruído, não somente mediante proibição, mas também pela desqualificação de seus falantes. Quem não conheceu expressões como “língua de grosso”, “língua de colono grosso”, “alemão batata, come queijo com barata”? “colono grosso, não sabe português”. Proibindo o idioma, subtraiu-se dos falantes o direito de se expressarem; desqualificando-a, quebrou-se sua espinha dorsal. A língua alemã, que antes era ensinada nas escolas, ficou órfã de sua representação escrita, ficou relegada à reprodução oral em espaços restritos.

A escola, com raras exceções, até bem pouco tempo e, em grande parte ainda, se mantém de costas para a riqueza linguística presente no meio em que atua. Desconsidera a semente linguística plantada pelos pais em casa. Trata a criança como tábua rasa, isto é, o que ela traz consigo de saber é tratado como inexistente ou imerecido de atenção. Isso contribui para que a criança aprenda que, seu mundo particular, aquilo que vem de sua família, não tem valor e assim se mantém as línguas e a cultura de seus falantes no desprestigio a que foram relegadas.

Enquanto escola e família não se unirem para juntos se empenharem substancialmente para que os filhos aprendam a valorizar amorosamente o seu lugar de viver e o que dele culturalmente faz parte, as crianças construirão um conhecimento desconectado de seu espaço vital.

Enquanto a escola, a comunidade reproduzirem apenas os valores globais, os valores transmitidos pela mídia, enquanto fizerem as crianças se fantasiarem de bruxa de Helloween, de personagens da novela das oito, de Faustão, será isso que estarão ensinando às crianças a valorizarem. O espaço coletivo de vida da comunidade e seu mundo cultural se esvairá de sentidos para esses seres. Posto que não lhes é plantado no coração benquerer por seu lugar de viver, o que inclui a construção um olhar amoroso para com o patrimônio coletivo imaterial presente em seu lugar de viver.