A REVISTA SUR E UMA VERTIGEM HORIZONTAL
Franklin Cunha
Médico
Membro da Academia Rio-Grandense de Letras
Estou folheando o número 349 da revista SUR, comemotativa do seu cinquetenário (1931-1981) e dedicada à literatura hispanoamericaca
SUR atuou também como editora e ambas foram fundadas pela escritora e grande estanciera Victoria Ocampo que a financiou durate 48 anos até sua morte. Mulher de importantes realizações intelectuais e literaria, pertenceu a uma das dinastías mais antigas e ricas da Argentina.Grande estanciera, por supuesto..
SUR era integrada por um conselho de notáveis personalidade da literatura universal: Ernest Ansermet, Drieu La Rochelle, , Waldo Frank, Pedro Henríquez Ureña, Alfonso Reyes, Jules Supervielle y José Ortega y Gasset e seu conselho de redação era composto por nomes como; Jorge Luis Borges, Oliverio Girondo, Eduardo Mallea, Maria Rosa Oliver e Guillermo de Torre.
No seu primeiro número Victoria Ocampo, estabeleceu a quem SUR se dirigía:
“Esta revista é a revista de todos que me rodeiam e que me seguirão no futuro. Dos que pensam na. América e nos que são da América. Dos que têm vontade de nos comprender e dos que ajudam a nos comprender”.
Para se avaliar o nivel da revista relacionamos alguns de seus colaboradores: Jorge Luis Borges, Adolfo Bioy Casares, José Bianco, Waldo Frank, Walter Gropius, Alfonso Reyes Ochoa, José Ortega y Gasset, Pedro Henríquez Ureña, Octavio Paz, Jules Supervielle, Ramón Gómez de la Serna, Eduardo Mallea, Ernesto Sabato, Federico García Lorca, Gabriel García Márquez, Gabriela Mistral, Silvina Ocampo, Pablo Neruda, entre outros.
Tenho , em minha biblioteca, cerca de trinta edições de SUR
Com a orientação firme de Victória , a revista foi vanguardista e original em sua orientação o que a converteu numa referencia obrigatória da cultura argentina.
Foi publicada até 1992 e o último número, o 371, foi publicado 13 anos depois da morte de sua fundadora.
SUR foi um espaço de debates e polémicas de autores consagrados que se rivalisaram por vaidades e por amores conquistados ou contrariados. A modernidade das letras e das artes se refletiu na revista graças ao seu prestígio editorial e também pelo financiamento generoso de Victória.Na sua parte editorial, SUR publicou obras de autores de vanguarda da literatura mundila como Garcia Lorca ,Juan Carlos Onetti, Alfonso Reyes Ochoa, Horacio Quiroga, Adolfo Bioy Casares, Aldous Huxley, Carl Gustav Jung, Virginia Woolf, Vladimir Nabokov, Jean-Paul Sartre, Jack Kerouac e Albert Camus.
ORIENTAÇÃO POLÍTICA E FILOSÓFICA
Segundo o qualificadíssimo ensaista Juan José Sebreli, a revista SUR adotou em sua primeira época uma orientação liberal e nacionalista. Borges, naquela altura estava em sua etapa criolista, escrevendo sobre poesía gauchesca. Um dos expoentes de orientação nacionalista foi Ezquiel Martinez Estrada autor de um excelente livro: Radiografia de la pampa (1933)uma lúcida interpretação da economía “ganadera da pampa argentina“ o qual sempre recomendo aos meus amigos ligados ao mesmo tipo de economia ( embora tenho dúvidas se algum deles o leu).
Ao lado do grupo de escritores que abordavam os temas nacionais e sulamericano, Sur também acolhia destacados nacionalistas como Lepoldo Marechal, Carlos Astrada, Ramon Doll, Julio Irazustra . Este escreveu um texto , referindo-se às reuniões na elegante casa de Victoria Ocampo ,notando que “naquelas tertúlias os escritores liberais se altercavam com os nacionalistas em um ambiente de convivencia civilizada”. Em 1933 Irazustra comentava que o comunismo de Waldo Frank, colaborador de SUR, coincidia com os nacionalistas no seu ódio à burguesía.
Em julho de 1939 houve um debate originado por uma nota apócrifa publicada em SUR – atribuída a Borges ou a Sabato –a qual ridicularizava “ la hispanidad retinta “ da revista Sol y Luna.Outro colaborador da revista,Ramon Doll, em sua revista El Pampero, fustigava Victoria Ocampo afirmando que Sur era um “ bazar de importados “.
A própria Victoria, inicialmente adepta do fascismo ( tanto que teve entrevistas privadas com Mussolini e com o Papa Pio XII), diante da Segunda Guerra Mundial, manifestou apoio aos Aliados ao passo que outros escritores de Sur , os nacionalistas e os católicos tinham simpatía pelos países do Eixo, embora sob a capa de uma posição neutralista que, aliás, foi a adotada por todo o governo imprensa e empresas argentinas
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Enfim, SUR foi uma admirável revista cultural,mais admirável por ter sido financiada por uma rica estanciera durante 48 anos, fatos que não se observam nos espaços culturais de nosso país. Nunca tivemos uma publicação do nivel de SUR e também nunca tivemos uma rica estanciera do nivel cultural de Victoria Ocampo, embora as tenhamos na situação financeira da escritora e mecenas argentina.
Historinha final e moral da história.
Entre os colaboradores e namorados de Victoria houve um, colaborador de SUR de nome Drieu la Rochelle. Era um intelectual ideológicamente da direita, fascista mesmo, um autêntico dandi parisiense que encantava todas as mulheres que dele se aproximavam, inclusive Victoria. Nasceu em 1893 e se suicidou em março de 1945 uma semana antes da libertação de Paris da ocupação nazista. Com Victoria ele manteve um longa correspondencia apesar de algumas divergencias ideológicas.
Há relato de uma visita que fez a Buenos Aires, quando Victória o levou a visitar uma de suas imensas estancias em pleno pampa argentino. Planícies que se perdiam de vista e de onde não se avistava nenhuma elevação de terreno por centenas de quilômetros. Drieu que nunca tinha montado um cavalo, nunca tinha visto uma extensão de terra tão imensa e com um horizonte tão extenso, desmaiou e caiu do cavalo. Socorrido por Victoria e outros convidados da revista SUR, ao recuperar os sentidos e indagado o que lhe acontecera respondeu que tinha sofrido “ uma vertigem horizontal”.
· O originalíssimo termo de Drieu, se aplica ao se olhar o horizonte cultural da atualidade brasileira, especialmente das privilegiadas categorías sociais que desde o descobrimento usufruem da imensa riqueza do país. Relatei a história da revista SUR para tentar explicar a evolução cultural de nossos vizinhos que gozaram de um perído de brilhantes escritores, de ensaistas de qualidade , de grandes escritores e editoras, de livrarias em cada quadra ( J.L. Borges: “ Buenos Aires é uma cidade de livrarias e retaurantes”), e de uma rica e culta classe média. Só depois disso é que a TV e a midia de baixa qualidade começaram também a atuar como formadoras da opinião pública.
· A diferença que nos causa vertigens é que nós passamos diretamente da condição de um generalisado analfabetismo para as TVs e as mídias de qualidade mais do que infantil, primária, deformadora intelectual e desinformadora da realidade política e econmômica do Brasil e do mundo.
· E disso estamos sofrendo as graves consequências vistas no panorama atual do pensamento e das atuações de nossas classes dirigentes .
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